Com direitos, mas ainda em grave risco

Ilustração do mundo circulado por figuras humanas unidas pelas mãos.

Por Thalif Deen, da IPS

Nova York, 23/11/2009 – Ao comemorarem na sexta-feira passada os 20 anos da Convenção sobre os Direitos da Criança, funcionários internacionais e especialistas fizeram um dramático chamado sobre as centenas de milhões de menores que ainda continuam submetidos à violência, ao abandono e abuso em todo o mundo. O cumprimento “dos direitos de meninos, meninas e adolescentes está longe de se consagrar”, insistiu a diretora-executiva do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Ann M. Veneman.

Apesar do enorme progresso conseguido, boa parte da infância ainda não conta com os serviços essenciais que lhes permita garantir sua sobrevivência, é vulnerável às doenças e à desnutrição, carece de acesso à água e ao saneamento e não recebe ensino de qualidade. Muitas crianças ainda não vivem em um contexto que as proteja da violência, do abuso, da exploração da discriminação e do descuido, destacou Veneman. A Organização das Nações Unidas calcula que a cada ano a violência atinge entre 500 milhões e 1,5 bilhão de meninas, meninos e adolescentes.

“Os continentes da África, em especial a região subsaariana, e Ásia, em particular o sul, têm as maiores concentrações de privação absoluta dos direitos da infância e exigirão uma atenção particular nos próximos anos”, acrescentou Veneman. O informe deste ano divulgado pelo Unicef faz um acompanhamento sobre as repercussões da Convenção sobre os Direitos da Criança (CDN). Desde sua aprovação em 20 de novembro de 1989 pela Assembleia Geral da ONU, mais de 70 países incorporaram códigos de proteção à infância às suas legislações nacionais.

Um saldo positivo é que a mortandade de menores de 5 anos passou de aproximadamente 12,5 milhões em 1990 para cerca de 8,8 milhões em 2008. Também é positivo que 84% das meninas e dos meninos em idade escolar frequentem o ensino primário, enquanto diminui a brecha de gênero nas matriculas. O estudo acrescenta que foram dados passos importantes para impedir que as crianças sejam incorporadas a milícias ou submetidas à prostituição ou à servidão doméstica. Mas, a pesquisa do Unicef enfatiza que meninos e meninas continuam morrendo de causas que podem ser prevenidas, como pneumonia, malária, sarampo e desnutrição. “Isso é inaceitável”, afirmou Veneman.

“Muitas das crianças nunca verão o interior de uma sala de aula e milhões carecem da proteção contra a violência, o abuso, a exploração, a discriminação e o abandono”, acrescentou, ao marcar os graves problemas que afetam a infância mundial apesar dos avanços obtidos em duas décadas. A Convenção, considerada a Carta Magna dos direitos da infância, compreende 54 artigos que respondem a quatro princípios fundamentais: a não discriminação; o interesse superior da criança; o direito à vida, à sobrevivência e ao desenvolvimento, e o respeito pelas opiniões das crianças.

Originalmente assinada por 140 governos e em vigor desde setembro de 1990, hoje já foi ratificada por 193 nações, com exceção dos Estados Unidos e da Somália. Mas, o Unicef diz que estes dois países demonstraram interesse em acelerar o processo de ratificação. Howard Davidson, da American Bar Association (ABA), organização voluntária com sede em Washington que reúne mais de 40 mil advogados norte-americanos, diz que Washington ratificou os dois Protocolos Optativos da Convenção da Criança, incluído o que se refere à exploração sexual da infância.

Desde então, a lei de Proteção às Vitimas de Tráfico e a Lei de Proteção eliminaram os obstáculos que impediam levar à justiça esses casos nos Estados Unidos e reforçaram as sanções contra quem abusa ou explora crianças tanto dentro como fora do país. A legislação também melhora a assistência às vitimas. Por exemplo, com programas especiais de visto para imigrantes menores de idade vitimas de tráfico, abuso, descuido e abandono pelos pais.

Davidson, perante o Fórum de Políticas Infantis realizado em Nova York, disse, na semana passada, que muitos países da América Latina e do resto do mundo reconhecem cada vez mais a igualdade de direitos e responsabilidades dos pais diante do cuidado de seus filhos, o que implica estarem sendo adotadas reformas jurídicas para reconhecer a paternidade fora do casamento. Para abordar especificamente a exploração sexual das crianças, muitos países elevaram a idade do consentimento sexual, modificaram os códigos penais para incluir a exploração sexual dos menores de idade através do tráfico e da pornografia, e reforçaram as sanções contra quem pratica abusos sexuais.

Meg Gardinier, diretor da organização Dia de Oração e Ação para a Infância, iniciativa da Arigatou Internacional do Japão, uma organização defensora dos direitos da criança, disse à IPS que o tratado melhorou a vida das crianças, de suas famílias e comunidades. Os benefícios com a ratificação da Convenção são evidentes porque o tratado fomentou leis, políticas e práticas positivas no plano nacional. “Dá apoio e proteção consistente às famílias para que possam criar seus filhos”, disse Gardinier. É hora de os Estados Unidos aderirem ao resto do mundo na ratificação da Convenção sobre os direitos da Criança, acrescentou.

Por outro lado, em uma solicitação que coincide com o vigésimo aniversário da Convenção, a União Norte-americana de Liberdades Civis (Aclu) pediu ao secretário da Defesa dos Estados Unidos, Robert Gates, que atualize a informação sobre os menores de idade que estão sob custódia militar no Iraque e no Afeganistão. Em carta dirigida a Gates, a Aclu também pediu informações sobre a política oficial de Washington referente ao tratamento, à detenção e ao processo judicial de menores de idade e seu cumprimento do direito internacional.

A carta assegura que, até maio de 2008, as forças militares norte-americanas mantinham sob custódia 413 crianças iraquianas como “ameaças à segurança” e haviam entregue um número desconhecido de crianças à custódia desse país. Até abril de 2008, cerca de 10 menores de idade estavam detidos na prisão afegã de Bagram. A Aclu disse que em maio de 2008 o Comitê da ONU sobre os Direitos da Criança analisou o cumprimento por Washington do Protocolo Optativo sobre a Participação de Crianças em Conflitos Armados, que os Estados Unidos ratificaram em 2002. Essa ferramenta garante proteções básicas aos ex-combatentes infantis.

O comitê criticou duramente o histórico dos Estados Unidos na detenção e no tratamento de menores de idade sob custódia militar desse país no exterior, e apresentou recomendações. “Os Estados Unidos podem melhorar sua posição na comunidade internacional e liderar com o exemplo ao demonstrar cumprimento com as recomendações do comitê relativas aos detentos juvenis”, disse Jamil Dakwar, diretor do Programa de Direitos Humanos da Aclu, em uma declaração divulgada na semana passada.

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Fonte de informação: IPS/Envolverde Link abrirá em uma nova janela ou aba.
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