Com medo da onda de assassinatos e sem acesso a albergues públicos, moradores de rua de Maceió estão mudando a rotina durante a noite para não serem vítimas da violência. Segundo dados da Polícia Civil, 30 assassinatos de sem-teto já foram registrados na capital alagoana este ano e estão sendo investigados. A maioria absoluta ocorreu durante a noite e madrugada.
O assassinato em série chamou a atenção de todas as autoridades locais e da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos. Em Alagoas, Ministério Público Estadual, Justiça e polícias se uniram para tentar chegar aos culpados pelos crimes. Segundo as investigações da Polícia Civil, não há um grupo de extermínio, e a maioria estaria ligada a acerto de contas entre eles mesmos.
Quem não tem acesso ao único albergue público da cidade – que possui apenas 50 vagas – e vive no centro da cidade usa a criatividade para se sentir mais seguro. O desempregado José André da Silva, 29 anos, adotou uma maneira inusitada: construiu uma casa de madeira e lona em cima de uma árvore no mirante de Santa Terezinha, ponto movimentado do bairro do Farol, no centro da capital alagoana.
O desempregado também não acredita na existência de um grupo de extermínio e disse que sente mais seguro – e confortável – em cima da árvore, onde mora desde junho. “Todos os [moradores de rua] que morreram deviam alguma coisa. Seja por drogas, roubo ou agressões. Quem fica longe disso tudo sobrevive. É a lei das ruas”, disse.
O local onde André mora foi montado com tábuas achadas na rua e coberto por lonas. “Aqui além de seguro, não levo chuva”, afirmou.
Para fugir da violência, outros moradores de rua mudaram a rotina e estão dormindo na porta das delegacias durante a semana. A entrada da delegacia de Homicídios, localizada no conjunto Santo Eduarda, é a preferida dos moradores de rua.
“Esta semana dormiram oito moradores de rua na porta da delegacia. Eles disseram aos meus policiais que se sentiam mais protegidos lá”, contou a delegada de Homicídios de Maceió, Rebeca Gusmão.
Mais vagas em albergue
Em contato com a reportagem do UOL Notícias, o secretário de Assistência Social de Maceió, Francisco Araújo, reconheceu que há falta de vagas no albergue, mas garantiu que na próxima semana o município vai dobrar o número de lugares do único existente na cidade, localizado no bairro do Poço.
“Nós hoje temos uma população de entre 100 e 150 pessoas que moram nas ruas, e acreditamos que com essa nova quantidade – e pela experiência que temos – supriremos a necessidade”, disse o secretário, informando ainda que a prefeitura não disponibiliza transporte para moradores de rua de outras áreas da cidade irem até o local.
Para garantir a segurança dos albergados, o município já solicitou ajuda da Polícia Militar. “Além disso, guardas municipais também fazem a proteção dos moradores de rua”, garantiu.
Investigações apontam crimes isolados
Apesar do alto número de mortes, a Polícia Civil descarta a existência de um grupo de extermínio atuando na capital. “Esses crimes são causados pelo aumento na facilidade do acesso às drogas na rua. Mais da metade desses casos não foram de arma de fogo, e sim arma branca e espancamento. Quando isso ocorre, eles mesmos afirmam que se trata de um acerto de contas entre eles”, assegurou a delegada Rebeca Gusmão.
Sobre a demora nas investigações, ela disse que há dificuldade em encontrar testemunhas, já que os moradores de rua “não gostam de conversar com a polícia”. “Mas alguns casos estão bem encaminhados; em outros é que não contamos com a ajuda deles. Já temos a certeza que alguns casos, por exemplo, foram executados por vigias da região central”, explicou a delegada, que é responsável pela investigação de 15 dos 30 assassinatos.
Na próxima terça-feira (9), o assessor especial da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Ivair Augusto Alves dos Santos, volta a Maceió para cobrar agilidade nas investigações e já tem encontros marcados com o procurador-geral de Justiça, Sergio Jucá, e com o prefeito de Maceió, Cícero Almeida.
Crescimento no número de mortes
Um levantamento realizado pelo Movimento de Meninos e Meninas de Rua mostra que, entre 1980 e 2002, pelo menos 103 moradores de rua foram assassinados na área central de Maceió – o que dá uma média de 4,6 crimes ao ano, número 85% menor que o registrado em 2010.
Diante da repercussão nacional do caso, nesta sexta-feira (30) o governador Teotonio Vilela Filho cobrou celeridade à Polícia Civil e deu um prazo de 15 dias para que os inquéritos sejam entregues à Justiça.
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Fonte: Portal A a Z