A hora e a vez das favelas

Por Bruna Ventura

Líder do AfroReggae, ONG referência no trabalho social com jovens carentes de diversas comunidades da capital fluminense, José Junior participou do encontro “Comunicando a Favela”, realizado na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no dia 21 de março. O apresentador do programa de TV Conexões Urbanas e diretor do reality show Papo de Polícia debateu temas como cultura da favela, processo de ocupação dos territórios pelas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), mediação de conflitos e iniciativas voltadas para a ressocialização de ex-presidiários e ex-traficantes.


Crédito: Grupo Cultural AfroReggae

Entre os projetos mais polêmicos encabeçados por Júnior está o que prevê anistia aos traficantes que desejam sair da criminalidade e conseguir um emprego. “Não significa dizer que eles não cumprirão pena alguma, cada caso deve ser analisado”, explica Junior. “O crime hoje não é mais rentável como era no passado e é muito mais genocida. Pode perguntar a qualquer um desses rapazes que largaram a criminalidade e hoje trabalham no AfroReggae e vocês verão que a vida deles melhorou e que eles conhecem muitos outros que gostariam de fazer o mesmo”, completou, ressaltando que a ONG já ajudou na contratação de duas mil pessoas, 900 delas ex-traficantes e ex-presidiários.

Sobre as UPPs, Junior afirmou: “As Unidades não são responsáveis pela falta de infraestrutura das comunidades. Isso é uma atribuição do Estado, dos programas sociais como o PAC – Programa de Aceleração do Crescimento – e, na falta destes, das ONGs. O gestor de segurança não pode ser considerado um gestor da comunidade”. Para ele, um líder comunitário, eleito pela maioria dos moradores, é quem deve exercer esse papel. “Além disso, para que exista diálogo, também é necessário que um porta-voz da comunidade possua um cargo em alguma das secretarias do governo”, acrescentou.

O problema, segundo ele, é que o mercado tem mais interesse em estar presente nas favelas do que o próprio governo. “No dia seguinte à ocupação do Alemão, já havia antenas de TV por assinatura no telhado das casas. Mas não havia novos postos de saúde, novas escolas, novos centros culturais”, criticou. Outra questão que recebe pouca atenção do Estado e da mídia é o deslocamento de traficantes para outras áreas do Rio de Janeiro. Após a ocupação, locais como Macaé, São Gonçalo e Campo Grande foram alvo de fugitivos. “Por mais que as autoridades neguem, está havendo uma migração de bandidos. Infelizmente, a questão só ganha visibilidade quando acontece na Zona Sul. O próprio Morro do Cantagalo só é um ‘shopping de ONGs’ porque está ao lado de Ipanema”, lamentou.

Já sobre o temor de que os investimentos no Rio de Janeiro estejam atrelados aos grandes eventos previstos para a cidade – Copa do Mundo e Jogos Olímpicos – Junior se mostrou otimista. “A UPP não tem mais volta, mesmo depois de 2016, acredito que exista continuidade de políticas voltadas para as comunidades”, afirmou. “Acho fundamental aproveitarmos esse momento em que o Rio é a bola da vez, tem recebido mais investimentos, foi notado até por Hollywood”, lembrou.

Entretanto, o líder comunitário ressaltou que a imagem da favela continua atrelada à violência. “Para a grande mídia, a favela ainda é um produto e, se não houver violência, não há sucesso e não há lucro”, disse. “Esse é um universo que ainda não foi sistematizado, é blindado. Só agora estamos começando a nos relacionar e a transitar por diferentes meios, como universidades, empresas, televisão”.

Ivana Bentes, diretora do Curso de Comunicação da UFRJ e coordenadora do evento, ressaltou a importância da periferia para a cidade: “Essa é a vitrine do Rio para o mundo. O que atraiu os olhares de fora foi o samba, o morro, o futebol, e não a classe média”, concluiu.

Fonte: Ibase

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