Marco Antônio Pellegrini, 46 anos, foi, recentemente, nomeado como Secretário Adjunto da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Casado, dois filhos adolescentes. Ao Jornal da AME, com exclusividade, conta sua trajetória na luta pelos direitos das pessoas com deficiência e o impacto da deficiência em sua vida. Pellegrini foi assessor de Recursos Humanos no Metrô e Diretor de Relações Institucionais da AME. Antes de ser nomeado Secretário Adjunto, atuava como Coordenador de Acessibilidade na Secretaria, desde sua criação, em 2008.
AME: Quando e como você adquiriu deficiência?
Marco Antônio Pellegrini: Passaram- se 18 anos quando fui vítima da violência urbana. O desfecho de um assalto a mão armada foi a terceira e quarta vértebras cervicais rompidas por uma bala, a tetraplegia e um desafio inesperado. Ficou para trás uma mãe órfã de um filho bandido, vitimante e vitimado.
AME: Antes desse episódio, já havia tido algum contato com a deficiência?
Marco Antônio Pellegrini: Passei minha juventude no bairro de Vila Mariana, tendo como arredores a AACD, o Lar Escola São Francisco e a APAE. A internet era a rua e os videogames, os carrinhos de rolimã, pipas, peladas e bicicletas. Vez ou outra uma luta aquecia a amizade entre a molecada. A relação com os frequentadores daqueles centros de atendimento era distante, víamos sem enxergar. Eram comuns nos pontos de parada de ônibus as mães com filhos com deficiência e a rotina das Kombis institucionais. Dividíamos o mesmo espaço, mas em universos paralelos muito distantes e reciprocamente desconhecidos. Os contatos mais próximos que tive foram: o livro “Feliz Ano Velho”, que li e parecia ficção e cujo autor Marcelo Paiva, sujeito genial, nem imaginava um dia conhecer pessoalmente e assemelhar-me; Hélio um vizinho muito amigo que desenvolveu hidrocefalia e que acompanhei sua perda da visão e morte precoce; e Sifão, um garoto que tinha pernas assimétricas e uma escoliose absurda, nunca tinha ido ao médico e não sabia ter deficiência, então disputava bolas e pipas ferozmente com qualquer um.
AME: Após ficar tetraplégico, o que mudou em sua vida, em termos profissionais e pessoais?
Marco Antônio Pellegrini: Mudou tudo. O corpo além de ser a interface com o mundo é principalmente interface consigo mesmo. Foi preciso retomar este diálogo, reaproximar-me de meu corpo e aprender novamente. Alguns chamam reduzidamente este processo de reabilitação. Daí, entendi a sensação de ficção causada na leitura do livro. É um momento de absurdos, um ensaio existencialista em quatro atos intermináveis: “Eu sou Eu”; “Este corpo não sou Eu, mas é Meu”; “Eu não sou mais Eu”; e “Quem sou Eu?”. Terminada esta ópera, olhei para fora e pareceu simples retomar questões convencionais como família, trabalho e sociedade. Parece concreto, mas é outra psique maluca, os fatores determinantes foram o não-verbalizado, nãoescrito e não-pactuado. Foi algo intuitivo, sem bússola, mas verdadeiro e com afeto. Sou grato ao processo, “Eu sou Eu”. Deu certo, voltei a tudo que gosto, me motiva e dá prazer. As asas são rodas, tecnologia e fundamentalmente gente.
AME: Qual sua trajetória na luta pelos direitos das pessoas com deficiência? Como chegou a esse processo?
Marco Antônio Pellegrini: Me envolvi com pessoas aguerridas à vida e na luta pelos direitos das pessoas com deficiência. Uma conspiração divina levou-me a este encontro e juntos fundamos o CVI-AN (CVI-Aracy Nallin), do qual fui presidente por 3 vezes, integrei a diretoria da AME e ministrei aulas no curso de informática da Instituição Beneficente Nosso Lar. Rumei para a Europa e EUA em busca de soluções tecnológicas e as trouxe. Foram muitos seminários, palestras e manifestações nas casas legislativas. Vivi intensamente a transição da Integração à Inclusão.
AME: O que representa essa nomeação para Secretário Adjunto da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência?
Marco Antônio Pellegrini: É um momento de grande responsabilidade, é uma pasta que tem como Visão ser referencia mundial no tema. Esse tema ocupa espaço de destaque nas agendas governamental e empresarial. Isso traz importantes impactos financeiros e sociais e, por isso, ocupar este posto significa estar mais próximo do olho do furacão. É uma grande satisfação ter a oportunidade de contribuir com a secretária Dra. Linamara Rizzo Battistella na implementação de políticas públicas que trouxeram e trarão progressos definitivos na equiparação de oportunidades as pessoas com deficiência.
AME: Poderia deixar uma mensagem para nossos leitores, a maioria sem deficiência?
Marco Antônio Pellegrini: O passado fixou-me marcas de sofrimentos e perdas que superei. Me fazem lembrar de onde vim, e não onde posso chegar.
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Eu estou confeccionando roupas para gente pequenas. (Anões).
E gostaria de divulgar.]
Obrigada
acir navarro