Mídia para a inclusão

Tuca Munhoz, foto de Alex Ribeiro
Tuca Munhoz, foto de Alex Ribeiro

Quando começou sua militância pela inclusão das pessoas com deficiência?

Começou quando eu tinha 19 anos. Naquela época eu não tinha carro e usava o transporte público para me locomover. Eu morava em São Caetano e tinha muita dificuldade para usar o ônibus. Isso me deixava muito chateado, fazia eu me questionar inclusive sobre a minha condição [Tuca Munhoz tem sequela de pólio e utiliza cadeira de rodas]. Certo dia, li no jornal que um grupo de pessoas com deficiência se reuniria para um debate. Achei muito interessante, consegui uma carona e fui a esse encontro. Foi o começo de uma mudança de pensamento, percebi que o problema não era eu ser deficiente, mas o ônibus não ser adaptado. O olhar se inverteu. Passei a perceber e a me conscientizar de que essa condição faz parte da diversidade humana e que a sociedade deve se organizar para conviver com essa abrangência.

Qual o trabalho desenvolvido pelo Instituto MID?
O Instituto MID trabalha para abrir espaços para que as pessoas com deficiência coloquem suas demandas e para conscientizar a sociedade sobre os preconceitos, a desinformação e todas as questões relativas a esse tema. Desenvolvemos esse trabalho na cidade de Santo André, região do ABC paulista. Também fazemos reabilitação em comunidades bem pobres, mobilizando as pessoas para melhores condições de vida. Fazemos tudo isso participando de uma série de ações. O Instituto MID foi criado em 1991, mas foi oficializado em 1996. É uma entidade pequena, com 15 pessoas, que desenvolve um trabalho muito importante.

Qual sua avaliação sobre políticas voltadas à inclusão da pessoa com deficiência no Brasil?
Percebo que a questão tem grande visibilidade hoje, especialmente de dez anos para cá. Antes, era difícil colocar esse tema em pauta, não só na mídia, mas no debate sobre políticas públicas também. A discussão ficava muito na linha da filantropia e do assistencialismo. Hoje, está mais inserido dentro das políticas públicas e dos direitos humanos. O Brasil tem uma legislação muito avançada nessa questão. Por exemplo: o tema da acessibilidade é bem presente, especialmente nos grandes centros urbanos. Claro que, quanto mais afastado para as periferias, menos acessos nós temos. E em algumas cidades isso é mais visível do que em outras. Em São Paulo, consigo me locomover bem, muitos ônibus são acessíveis. Mas, por exemplo, em Brasília, onde estive recentemente, eu precisei chamar um táxi para ir de um hotel a outro muito próximo, porque não tinha como ir a pé. O fato positivo é que hoje qualquer pessoa reconhece a acessibilidade como um direito de todos e um dever do Estado. Também na Educação esse tema avançou. Antes havia uma impermeabilidade em falar sobre inclusão de pessoas com deficiência no ensino regular. Pelos dados do Ministério da Educação, há 15 anos apenas 130 mil crianças com algum grau de deficiência estavam no ensino regular. Hoje, já passa de meio milhão de crianças. Também identificamos avanços no mercado de trabalho. A lei que reserva parte das vagas para pessoas com deficiência tem 30 anos, mas só há sete tem sido efetivada. As empresas são fiscalizadas e acabam contratando.

E que mudanças identificamos na mídia?
Há uma questão interessante: em razão da inclusão na escola e no mercado de trabalho, parte da mídia tem descoberto essas pessoas como público consumidor em potencial. Então, algumas revistas foram criadas, mas sempre com esse viés comercial. Não deixa de ser uma iniciativa. Outra mudança vem na TV. Duas emissoras criaram programas voltados para esse segmento [TV Brasil e TV Senado], nenhuma delas na TV aberta, infelizmente. O importante é acabar com o estigma da pessoa com deficiência como alguém incapaz. Esse olhar de assistencialismo e filantropia é equivocado. Acabamos de ver na TV uma campanha para arrecadar doação para uma entidade cujo enfoque era: “vamos ajudar a pessoa com deficiência”. Por melhor que seja a intenção, é uma abordagem antiquada, paternalista e assistencialista que só puxa para trás o trabalho de luta por políticas e direitos.

É por essa razão que o Instituto MID desenvolve trabalhos com a mídia?
Uma das questões que sempre falo é a da importância das pessoas com deficiência se colocarem, sem a presença de intermediários, de alguém que fale por nós. Conquistar espaço nos meios de comunicação para que a gente possa falar, colocar nossas críticas, nosso ponto de vista e nossa imagem. O Instituto MID criou o Minuto da Inclusão, programa de rádio com um minuto de duração que divulga informações sobre o tema, e que se tornou um projeto importante até mesmo na questão da conquista da auto-estima. Queremos, como movimento, conquistar esse espaço na mídia para falar e ouvir. Esse espaço ainda é pequeno nas emissoras de TV. Em novelas, tivemos recentemente o caso da personagem Luciana, retratado em Viver a Vida, da Rede Globo, foi muito marcante. Mas naquela história, ela pertencia a uma família rica, cheia de recursos, o que não é o caso da maioria da população. Temos de pensar numa política de inclusão que seja sistêmica: o trabalho, o acesso, a formação.

De que forma a TV pode ser uma ferramenta de inclusão da pessoa com deficiência?
Além de abrir mais espaço para discussão e de inserir o tema nos noticiários, penso em dois projetos: a adaptação do projeto Minuto da Inclusão para a TV, com programetes que entrariam como interprogramas, para levar informações e conscientização; e a criação de um programa de debate, convidando pessoas das mais diversas áreas de formação, com deficiência ou não, para dialogarem sobre vários aspectos e pontos de vista. E quem sabe até uma versão desse debate com o público infantil? Também queremos desenvolver uma espécie de informativo direcionado aos profissionais que trabalham com mídia, para orientá-los sobre a melhor forma de abordar o tema.

Tuca Munhoz : O filósofo tem 53 anos de idade e há mais de três décadas trabalha pela inclusão das pessoas com deficiência na sociedade. Ele é presidente do Instituto MID para a Participação Social das Pessoas com Deficiência, entidade fundada em 1991 que luta pela ampliação da participação social das pessoas com deficiência. Entre os projetos que desenvolve está o Minuto da Inclusão, programa de rádio, com um minuto de duração, que traz informações para ampliar o repertório da população, na construção de uma sociedade mais acessível. O programa é veiculado por 130 emissoras de rádio de todo o Brasil e distribuído também em versão em espanhol, para 14 países da América Latina e para os Estados Unidos.

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Fonte: Revista SESC TV

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