Lais Mendes Pimentel e Patricia Almeida *
O debate sobre inclusão escolar avançou nas últimas semanas a partir de dois fatos: o anúncio do “possível fechamento” do Instituto Nacional de Educação de Surdos e do Instituto Benjamin Constant, para alunos cegos; e, o massacre de 12 jovens numa escola municipal de Realengo por um ex-aluno da instituição.
Não, o INES e o IBC nunca estiveram a ponto de ser fechados. O que não significa que devam ficar imunes a mudanças previstas pelo movimento mundial da inclusão, que prevê a gradual extinção das escolas especiais e incorporação dos alunos com deficiência nas escolas regulares perto de suas casas, direito inegociável inscrito em nossa Constituição.
Há 17 anos o Brasil assinou a Declaração de Salamanca, assumindo um compromisso internacional de promover a inclusão de alunos com necessidades educacionais específicas na rede regular de ensino, o que foi ratificado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência em 2008.
A Educação Básica é, então, direito de todos indiscriminadamente. A segunda situação chocou o Brasil.
Wellington Menezes, ex-aluno da Tasso da Silveira, volta à escola e dispara 60 tiros, matando 12 crianças. Primeira reação: o assassino era um maluco! Logo, parentes e ex-alunos da Tasso da Silveira revelaram que o rapaz tinha sabidos problemas psicológicos e fora vítima de Bullying. O que Wellington Menezes fez foi um acerto de contas. De vítima, ele passou a algoz.
Vem do Canadá o relatório que mostra como escolas realmente inclusivas são mais seguras.
“As raízes desse comportamento agressivo dos estudantes encontram-se em seus sentimentos de alienação, no fato de não acharem que pertencem ao ambiente escolar. Este problema é agravado pelo fracasso das escolas em atender às necessidades educacionais e emocionais desses alunos que se sentem excluídos. É este tipo de situação, em sua forma extrema, que propicia tragédias como as que ocorreram na Columbine High School e no Virginia Technological Institute.”
No Brasil, salas de recurso foram criadas para atender alunos com necessidades especiais. O que deve incluir também jovens sem diagnóstico de deficiência, mas que precisam de uma atenção extra ministrada por uma equipe multidisciplinar. São alunos que sofrem abusos em casa ou mesmo que têm problemas psicológicos, como era o caso do Wellington Menezes.
Mas há quem seja contra a inclusão escolar. São os que ignoram o quanto a Educação inclusiva estimula não só o “especial” como também educa a sensibilidade do aluno “não especial”. Fora os que preferem manter a alocação de vultosas verbas federais e o prestígio político das antigas instituições.
Quem defende a segregação com o argumento de que a Educação já é ruim sem inclusão está cometendo um perigoso erro de lógica, uma inversão rudimentar da relação causa-efeito.
O preço da Educação “exclusiva” é o Bullying. E ninguém está livre de ser uma vítima dele.
* LAIS MENDES PIMENTEL e PATRICIA ALMEIDA são jornalistas e mães de crianças com síndrome de Down.
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Fonte: Publicado na parte de Opinião do jornal O Globo
28/04, Primeiro Caderno, página 8.
Somente um site deste chama um bandido de “vítima”, prestem atenção em todas as notícias e descobrirão que a maioria dos conhecidos dele (inclusive da escola) afirmaram que ele era recatado, mas, não sofria Bullying. Aliás, Bullying é a palavra da moda, recentemente um senador brasileiro tomou o gravador de um jornalista durante uma entrevista e depois disse que fez isto porque era vítima de Bullying da imprensa. Este site ganha algum dinheiro do público ou privado (para depois descontar no IR)? Eu acredito que sim, e não duvido que seja para apoiar os desatinos do governo.
Como pode constatar no link http://www.inclusive.org.br/?page_id=5425 , a Inclusive e uma revista digital autonoma e voluntaria, portanto nao recebe verba alguma publica ou privada.
Atenciosamente,
Patricia Almeida
Equipe Inclusive
Sou pai de um menino surdo, de quatro anos; e solidarizo-me completamente com Laís Pimentel e Patrícia Almeida. Mas é preciso dizer uma coisa que não está senedo dita pelos defensores da inclusão total: é que não existe esse genérico universal chamado “deficiência”. Se aos portadores de síndrome de down as pesquisas demonstram ser melhor a convivência com outros meninos, em toda sua diversidade, isso é assim porque o compartilhamento das experiências, com base numa língua comum, é bom para todos: é na língua que se dá o conflito, as relações, as modificações de significantes, as superações… mas, pergunto, quando não se tem uma língua comum? Quando crianças de 0 a 11 anos precisam ainda conviver com outros iguais a elas para aprenderem e exercitarem sua língua, que não é falada em casa, nem no parquinho de casa, nem na praça pública, nem na televisão, sendo a escola, portanto, um lugar privileigiado (e quase único) para a aquisição da língua (logo, da linguagem), sob pena justamente de não adquirirem aquele desenvolvimento que as crianças que têm síndrome de down também precisam adquirir na partilha mais ampla de sua língua com outras crianças que também a falam? Sim, queremos que nossos flhos sejam incluídos no sistema educacional e na sociedade. Mas, para isso, precisam ter acesso a escolas em que aprendam e vivienciem sua língua. Sim, escolas bilíngues, não escolas especiais. Somos a favor da inclusão escolar, mas essa inclusão não necessariamente ocorre nas escolas monolíngues (de língua oral), mas, COMO O DIZ A PRÓPRIA DECLARAÇÃO DE SALMANCA, pode ser que precise ocorrer em salas e escolas específicas; a essas escolas específicas, o decreto 5.626/2005 chamou de clases e escolas bilíngues, que têm a língua de sinais como primeira língua e a língua portuguesa, em sua modalidade escrita, como segunda língua. Laís e Patrícia, nossos objetivos são os mesmos: que nossos filhos se incluem e permaneçam no sistema educacional; que eles sejam retirados das “escolas especiais”; que eles tenham o mesmo direito à escolarização. Mas no caso de meu filho, que é surdo, que não fala a mesma língua que seus filhos, a melhor maneira disso acontcer é a escola bilíngue libras / português. Seria terrível para seus filhos não poderem aprender e exercitar uma língua: essa alienação linguística retiraria deles todo desenvolvimento psíquico e cognitivo. É disso que meu filho está ameaçado. Sou solidário à sua luta; peço que sejam à minha.
Concordo plenamente com voce, Emiliano, so que acredito que a convivencia com outras criancas surdas deve se dar no contra-turno, seja em sala de recursos na mesma escola ou em outra instituicao. E seu filho deve ter interprete de Libras na sala da escola regular. Nossa luta e, sim, a mesma.
Att,
Patricia Almeida
Equipe Inclusive
Interessante as provocações colocadas com a matéria. A pseudoinclusão provoca consequências incalculáveis, com desdobramentos sociais, educacionais e individuais.
Só me preocupo com os muitos sentidos que estão sendo dados ao trabalho realizado nas Salas de Recursos Multifuncionais (SRM). Nestas salas é realizado o Atendimento Educacional Especializado (AEE) para um público-alvo bem específico: alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, segundo a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva Inclusiva (2008).
Por razões bem definidas nesta Política as SRM não podem servir para resolver situações conflituosas de seus alunos e do ambiente escolar. O caratér do AEE que acontece nas SRM é complementar e/ou suplementar ao ensino que acontece nas salas regulares, ou seja, estamos falando de um serviço criado para assegurar a qualidade do ensino e a permanência dos alunos público-alvo da Política na escola.
Assuntos como violência, drogas, racismo, dentre outros, devem ser tratados na escola sim, mas como temas transversais. As contribuições do trabalho realizado por uma equipe multidisciplinar são comprovadamente exitosos, embora pouco valorizado pela maioria dos gestorese escolares.
Na verdade, o fracasso escolar está apresentando as suas muitas faces. O caso Wellington é a prova disto. Devemos ter cuidado com as inicativas que pretendem utilizar as SRM para não correr o risco de (re)criarmos práticas do tempo da integração e transformarmos as SRM em salas especiais.
Todo cuidado é pouco.
Patrícia, você me diz que “a convivencia com outras criancas surdas deve se dar no contra-turno, seja em sala de recursos na mesma escola ou em outra instituicao. E seu filho deve ter interprete de Libras na sala da escola regular”. Queria que você desse atenção ao que estou falando: vc acha que alguém aprende e desenvolve sua LÍNGUA NATURAL no contraturno escolar? Por exemplo, você acha que seu filho poderia ter acesso ao Português somente no contraturno escolar? Você acha que seu filho poderia ter aulas pensadas e planejadas em libras, com a ajuda de um intérprete para Português, mas com a condição de que todo o resto do mundo falasse Libras? Mais ainda: com a condição complementar (não suplementar) de que seu filho não conseguisse ver os sinais? Você concordaria então, que seu filho CEGO, vivendo num mundo em que todos falam LIBRAS (língua espaço-visual), tivesse acesso a uma escola onde o aprendizado de Português fosse apenas no contraturno, com um intérprete em sala de aula, sendo esta a única pessoa com quem ele falaria/conversaria? Seu filho poderia desenvolver-se intelectualmente, emocionalmente, nessas condições? Não, né…? Pois bem, suas palavras – bem intencionadas, sem dúvida – estão propondo que meu filho de 4 anos, que ainda está aprendendo Libras na escola bilíngue em que ele estuda, deixe as aulas concebidas, planejadas e dadas em Libras, por uma escola com aulas concebidas/planejadas/dadas em Português, com ninguém mais falando a língua dele (e que ele ainda está aprendendo, repito) em sala de aula, com um contraturno ao lado de várias outras crianças que também não sabem libras, embora algumas dentre elas sim… o resultado disso, como já demonstram as pesquisas realizadas no Brasil e no exterior, é um só: fracasso escolar, além de angústia, baixa autoestima, baixa autoconfiança… Você conhece seu filho, eu conheço o meu. Leio e estudo há alguns anos sobre a libras, a cultura surda, a educação surda… Confio que você faça o mesmo. Por isso te apoio. Peço que pare para pensar no que surdos, pais de surdos e estudiosos da educação surda estamos dizendo. Os surdos não precisam de AEE, precisam apenas do que o art. 22 do Decreto 5.626/2005 (Lula/Haddad) diz: Escolas e classes bilíngues (não confundir, como o faz a arrogante e pretensiosa Secretaria de Educação Especial do MEC, com escola especial). Ninguém pode pensar, aprender, ensinar, amar, senão em sua própria língua. Como dizem os ciganos, só podemos falar a verdade em nosa própria língua. é preciso abandonar as fórmulas prontas e deixar a vida falar, ouvindo-a.
Para as crianças surdas, como descreve Emiliano Aquino, o turno é uma perda de tempo. Não entendem a tradução em LIBRAS (qdo há) e ficam perdidos e ã toa. Vamos ainda obrigá-los a um longo contraturno? Por que não se ter turmas de Surdos, aprendendo LIBRAS?
DEPOIS, podem COMEçAR a aprender português-por-escrito, uma nova modalidade da língua portuguesa postulada por Daniele Grannier da UnB e que já deu certo em Brasília.
O insucesso do ensino de português em sua modalidade escrita (oral nem se fala!) para surdos pré-linguísticos é um grande problema para as escolas, inclusive o INES.É preciso introjetar via língua, alguma língua, input para desenvolver um sistema cognitivo completo. O sistema de Brasília atende aos dois requisitos, mas está no início. Faltam professores, dinheiro e inteligência por parte do MEC.
Tudo isso é muito complexo e merece uma profunda reflexão. Pensando sempre no sistema público, que é o que conta para a população.