Protegendo mulheres e meninas com deficiência contra a violência

Palma de mão aberta em concha segura fita rosa com brilhante no meio.

O artigo abaixo relata a situação na Australia. Como será no Brasil? Provavelmente igual ou pior. Precisamos com urgência investigar e tomar providências.
Equipe Inclusive

*Elizabeth Broderick e Graeme Innes

Mulheres e meninas com deficiência australianas têm duas vezes maior probabilidade que as sem deficiência de sofrer violência, mas esta realidade sempre esteve fora do debate público, escrevem Elizabeth Broderick e Graeme Innes.

” Você está falando de estupro? Fui estuprada várias vezes. A gente tem que se acostumar com isso.”

Imagine que a sua filha, irmã, mãe, esposa, namorada ou amiga tivesse tido a grande infelicidade de que isso acontecesse com ela – e que esta declaração, cheia de impotência e resignação, fosse sua resposta a essa enorme violência contra ela.

Agora imagine que ela está em uma instituição médica ou assistencial, porque ela é uma mulher com deficiência – uma mulher com deficiência intelectual ou doença mental, uma mulher que tem uma deficiência que limita severamente suas habilidades motoras e de fala, ou uma mulher cuja deficiência faça com que ela permaneça na cama – você pode até citar outros exemplos de mulheres que você conheça.

O trágico é que esta frase é verdadeira. Foi dita por uma mulher com deficiência durante uma entrevista que faz parte de uma pesquisa realizada pela Universidade de Western Sydney, na Austrália.

Estamos tentando formar uma imagem para que você tenha uma ideia melhor – e essa imagem é horripilante.

Ele também é muito comum dentro de nossa comunidade, e continua a ser discretamente varrida para debaixo do tapete – como acontece há muito, muito tempo.

Uma pesquisa recente da Universidade de Nova Gales do Sul descobriu que as mulheres e meninas com deficiência australianas têm duas vezes mais chance que as mulheres e meninas sem deficiência de sofrer violência ao longo da vida.

Para colocar isso em perspectiva, as mulheres e meninas com deficiência representam uma em cada cinco membros da população feminina da Austrália e as taxas de violência não só são significativamente mais elevadas. Elas acontecem com maior freqüência, por mais tempo, de mais maneiras diferentes e por um maior número de criminosos.

Há dois anos, o jornal Melbourne Herald Sun informou que segundo registros, entre janeiro de 2009 e julho de 2011 mais de dois clientes do Departamento de serviços de saúde foram atacados todos os dias, em média, com cerca de 1.800 ataques, crimes sexuais ou alegações de estupro relatados nos 30 meses até julho 2011. Em mais de 500 desses casos, cerca de 28 %, funcionários e cuidadores indicados pelo Estado foram acusados.

Em uma declaração que serve para todo nosso país, a Advocacia Pública constatou: ” Por muito tempo, casos de suposta violência têm sido erroneamente descritos como “incidentes “, e resolvidos pela gestão interna, em vez de serem denominados e tratados como supostos crimes.”

É uma realidade vergonhosa que as mulheres e meninas com deficiência australianas sofram altos níveis de violência doméstica e familiar e agressão sexual, e raramente tenham acesso aos serviços comunitários relacionados à violência doméstica e agressão sexual.

Tome a história de Rosa, por exemplo, relatada pelo Serviço de Direitos das Pessoas com Deficiência Intelectual, em seu Relatório de Acesso a Justiça de 2008. Rosa é uma mulher de 50 anos com deficiência intelectual e paralisia cerebral que fala pouco e se comunica usando algumas palavras e gestos. Quando ela disse a um funcionário de apoio que um outro funcionário de apoio a havia estuprado, a polícia e os pais de Rosa foram chamados. Usando palavras e gestos, ela disse à polícia que queria fornecer provas e prosseguir com as acusações contra o trabalhador de apoio. No entanto, quando a polícia buscou o consentimento, os pais de Rosa recusaram a entrevista da polícia e um exame médico para obter provas do estupro. Rosa acabou conseguindo receber o apoio de um advogado, mas a essa altura já era tarde demais para obter evidência médica, e a investigação foi abandonada.

A história de Rosa expõe as complicações adicionais que os sobreviventes de violência podem enfrentar na tentativa de acessar a justiça.

Apenas por um momento, imagine-se nessa situação. O que você faria ?

Em outros casos, soubemos de mulheres residentes em instituições sendo efetivamente prostituídas – trancadas nos quartos e forçadas a servir outros homens residentes, muitas vezes sendo pagas com o que foi descrito como “uma tragada e uma trepada”.

O ponto crucial aqui é que, em vez disso ser visto como uma prioridade fundamental para uma ação nacional, a violência contra as mulheres e meninas com deficiência tem-se mantido em grande parte fora do debate público, das discussões de política social e dos processos de reforma do sistema de serviços.

Isso tem que mudar.

Hoje, Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra a Mulher, é a oportunidade perfeita para todos nós emprestarmos nossa voz a essas mulheres e jogar luz sobre as suas experiências muitas vezes esquecidas – e para começar a tomar todas as medidas que pudermos para garantir que as mulheres e meninas com deficiência possam usufruir do que, afinal, é seu direito humano fundamental de liberdade contra a violência, exploração e abuso.

Elizabeth Broderick é Comissária contra Discriminação Sexual e Graeme Innes é Comissário contra a Discriminação das Pessoas com Deficiência da Austrália

Tradução – Patricia Almeida, Equipe Inclusive

Fonte – http://www.abc.net.au/news/2013-11-25/broderick-innes-protecting-women-and-girls-with-disability/5115472

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