Os riscos do diagnóstico precoce de autismo na infância

Fita feita de quebra-cabeças coloridos - símbolo do autismo

Segundo as últimas estatísticas do CDC (Centers for Disease Control and Pevention), uma em cada 68 crianças apresenta Transtorno do espectro autista. Considerando que este mesmo Centro estimou que entre 2000 e 2002 a estimativa era de uma para 150 crianças, houve, em 12 anos, um aumento de 120% da incidência desse transtorno. Ou seja, segundo esses dados, estaríamos enfrentando uma epidemia de autismo.

Perplexos, todos se perguntam, sem encontrar uma resposta convincente, o que explicaria um aumento tão expressivo desse transtorno. Uma das hipóteses mais levantadas pelos autores das pesquisas é a de que esses números crescem a cada dia porque só agora se sabe diagnosticar o autismo. Bem ao contrário, pensamos que estes números aberrantes são o efeito de uma prática diagnóstica hegemônica nos dias de hoje, para nós bastante questionável e perigosa, por dois fatores. Primeiro, porque esta prática diagnóstica baseada no DSM V, em que basta listar sintomas e agrupá-los com sua correspondente etiqueta para se obter um diagnóstico, não leva em consideração o contexto psicossocial desses sintomas. Segundo, porque o Transtorno do Espectro autista (categoria classificatória criada pelo DSM V) considera como sinal de autismo, vários comportamentos que são próprios da infância e outros que também podem ser encontrados nas mais diferentes situações ou condições psíquicas das crianças. Andar nas pontas dos pés, gostar de girar objetos ou seu próprio corpo, falar na terceira pessoa, seletividade alimentar, crises de fúria intensas, por exemplo, são encontrados no desenvolvimento habitual das crianças. Mesmo a evitação do olhar, o embotamento afetivo, o isolamento, baixa tolerância à frustração, repertório restrito de interesses, podem ser encontrados nas mais diferentes situações de dificuldades enfrentadas pela criança. Por si só, eles não são, nem indicam, necessariamente, risco de autismo, muito menos, são suficientes para diagnosticá-lo.

Na contramão desse jeito de fazer diagnóstico, temos, ao longo desses anos alertado para o risco que representa essa prática diagnóstica, sobretudo quando se lida com crianças muito pequenas. Justo porque a criança em todos os aspectos do seu desenvolvimento encontra-se em pleno devir, o máximo que podemos e devemos dizer sobre esses sinais são um alerta de que algo não está indo bem com essa criança e, portanto, que ela precisa ser cuidada o mais cedo possível.

Daí gostarmos de dizer no CPPL que prevenir é cuidar. Para concluir, poderíamos dizer então que, se por um lado devemos estar atentos, acolher e cuidar precocemente dos sinais de alerta emitidos pelas crianças, por outro, devemos também atentar para o grande risco de diagnosticar o Transtorno do espectro autista ou qualquer outro, sobretudo para as crianças muito pequenas, porque termina-se por induzir justo o que se quer prevenir e evitar.

Fonte: Infância, ano 2, n. 1, abr./2014./CPPL

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