Especialistas debatem necessidade de avaliação da educação infantil

Avaliação da educação infantil na perspectiva da garantia dos direitos das crianças

Quando se fala em avaliar a educação, alunos, pais e professores chegam a sentir arrepio. Já são tantas as avaliações e, consequentemente, tantos preparatórios para esses testes que muitos especialistas afirmam já ter perdido o sentido. Agora vem a proposta de avaliar a educação infantil, que compreende dos 0 aos 5 anos de idade. Para debater o tema e disseminar experiências nacionais na perspectiva da garantia dos direitos da criança, será realizado no próximo dia 17 de setembro, das 9h às 17h30, o 1º Seminário Nacional de Avaliação da Educação Infantil, no Auditório da Torre Santander, em São Paulo. Apesar de ter as inscrições encerradas em menos de 24 horas, devido à grande procura, os interessados poderão acompanhar o evento pela internet, no site www.movesocial.com.br

Promovido pelo Instituto C&A, o Banco Santander e a Consultoria Move, o seminário reunirá importantes especialistas da área, como a coordenadora de Educação Infantil do Ministério da Educação (MEC), Rita Coelho, a pesquisadora da Fundação Carlos Chagas e professora da PUC-SP Maria Malta Campos e a consultora da Secretaria Municipal da Educação de São Paulo no que se refere à construção dos indicadores da qualidade da educação infantil no município, Bruna Ribeiro.

Em entrevista ao Educare, Bruna Ribeiro falou sobre a necessidade de ter uma avaliação que verifique a qualidade do ensino infantil e aproveitou para esclarecer que, ao contrário do que muitos temem, as crianças não terão de fazer testes, como acontece com estudantes do ensino fundamental e médio. Confira:

O seminário irá discutir a avaliação da educação infantil, mas afinal, como a educação infantil pode ser avaliada? As crianças também terão de passar por testes?

A avaliação que estamos falando é na perspectiva de garantia dos direitos da criança, para a melhoria da qualidade do atendimento. Então nesse caso são avaliadas desde a infraestrutura, que é o espaço físico, até a formação do professor. A ideia não é avaliar a criança e esse é o grande diferencial. A proposta é avaliar o contexto educativo, para ver se possibilita uma educação de qualidade. A avaliação da educação infantil é diferente das outras etapas. Aliás uma tendência da discussão é falar sobre o modo como as outras avaliações têm sido feitas. É um ponto polêmico. A ideia é construir a avaliação da educação infantil sem tomar emprestadas avaliações de outras etapas, como por exemplo pegar a da educação fundamental e adaptar, mas sim elaborar algo específico para as crianças. O único documento nacional que temos até agora para medir a qualidade é um instrumento de autoavaliação, em que a própria escola aplica. Não existe um outro, então o seminário quer pensar essas perspectivas. Por outro lado, temos muita coisa acumulada no campo da educação infantil, temos documentos e uma série de experiências no País todo, por isso mapeamos as experiências do Brasil e iremos reunir no seminário essas diferentes propostas, que ajudarão a pensar metodologias de avaliação.

Nesse sentido, de medir a qualidade do ensino, a avaliação é de extrema importância. Por que só agora está sendo discutido o tema no Brasil?

Isso vem de um contexto nacional onde está sendo construída uma política para a educação infantil, que faz parte da primeira etapa da educação básica. Temos um documento nacional chamado Indicadores da Qualidade na Educação Infantil, que vem sendo discutido e pensado como é que pode auxiliar nesse momento. Um grupo de especialistas está conversando sobre esse material e pensando em como pode ser aproveitado tudo o que o Brasil já construiu nessa área para formular uma política específica para a educação na infância e, consequentemente, poderem discutir desafios e perspectivas para a avaliação.

Participam do evento membros de diversos órgãos representativos da área da Educação. Dessa discussão pode ser gerado um modelo de avaliação?

Eu não seria tão ambiciosa assim em dizer que já sairá um modelo nacional pois trata-se de um seminário, precisaria de outras instâncias para isso, embora tenhamos representantes do Ministério da Educação (MEC), da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), entre outros órgãos. Mas desse encontro podem sim sair princípios que norteadores dessa avaliação. À parte desse evento existem dois grupos de trabalho formados através de convite publicado por uma portaria ministerial: um é político e outro formado por especialistas. Esses grupos são responsáveis por apresentar uma proposta de avaliação. Do grupo de trabalho político participam membros do MEC, Inep, entre outros órgãos. Já do outro grupo, formado por especialistas da educação, eu participo.

Como você avalia o ensino infantil hoje no país? Quais são suas deficiências e qualidades?

Visitei diversas unidades escolares no Brasil e no exterior e o que me chama a atenção em primeiro lugar é que a legislação da educação infantil no País é uma das mais avançadas. Temos bons documentos, muita coisa produzida, orientações… O norte da Itália é referência na área da educação infantil no mundo e nossos documentos não deixam a desejar em nada. Aqui não é uma discussão que começa do zero. O nosso grande desafio é como traduzir isso em práticas. Já sobre as deficiências, a constatação é que as faculdades de formação de professores não contemplam o ensino dos 0 aos 3 anos, elas pulam essa parte dos bebês. Tem um estudo da professora Bernadete Gatti sobre as ementas dos cursos de Pedagogia e o que ela constatou foi isso. E se olharmos os números, no Brasil só temos 20% da população de 0 a 3 anos dentro da creche, porque não existem vagas suficientes. Tem cidades que oferecem duas ou três creches para o município inteiro, então os bebês estão completamente fora do sistema de ensino.

Por que a infância ainda não é contemplada de forma integral?

Isso por conta do histórico do País, que começou a atender os maiores. Em termos de Brasil, essa questão precisa ser estruturada. O Plano Nacional da Educação (PNE) fala sobre aumentar o número de vagas, para atender o dobro, mas mesmo assim os bebês não serão totalmente contemplados pois estamos falando de ampliar a oferta, mas está longe de chegar em 100%. Aqui em São Paulo tem uma ação pública contra a Secretaria Municipal da Educação, que precisa inserir 150 mil crianças na creche, ou seja, tem de criar 150 mil vagas e a questão é como ampliar a oferta garantindo a qualidade. A avaliação do ensino infantil surge para isso, para garantir as condições básicas. Não adianta colocar a criança em qualquer espaço sem materiais, então a avaliação tem a ver com esse momento histórico que o País está vivendo, em que é preciso ampliar as vagas e ter qualidade.

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