
Por Carmen Vasconcelos
no Correio 24 Horas
Maria Clara estava acompanhando o irmão mais novo na creche, quando o desabamento de uma laje no terreno vizinho atingiu a menina de 7 anos. O caso, inicialmente, foi tratado no Hospital Geral do Estado (HGE), mas se complicou em virtude de uma infecção bacteriana e ela foi parar no Hospital São Rafael (HSR). Enquanto aguarda o tratamento chegar ao fim, ela conta com o apoio da família e as aulas de um projeto que leva a escola para as unidades de saúde de Salvador: o programa Classe Hospitalar.
“Não gosto muito de Matemática, mas as professoras estão me ajudando com as dúvidas”, comemora a garota que, no dia da visita da equipe de reportagem, estava tendo a primeira aula de música. Clara é uma das alunas de um programa que atende uma média de mil a 1.200 estudantes por mês em 13 hospitais, quatro casas de apoio e 18 pacientes em seus domicílios.
De acordo com a coordenadora de Inclusão Educacional e Transversalidade da Secretaria de Educação do Município, Tainã Rodriguez, mais que possibilitar o acesso à educação, a iniciativa funciona como um elo de ligação entre o paciente que fica recluso no ambiente hospitalar e o mundo exterior.
“O programa contempla a inclusão, especialmente alunos da rede municipal e pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS)”, esclarece a pedagoga, ressaltando que o programa conta com uma equipe de 44 pedagogos, três professores de Música e três coordenadores. Todos estão vinculados à Secretaria Municipal de Educação.
Funcionamento
Para quem imagina uma sala de aula tradicional dentro de um hospital, vale dizer que as classes hospitalares estão longe de um ambiente sisudo, tedioso ou formal. Pela condição dos alunos e para contrapor com as formalidades das unidades de saúde, os espaços são coloridos e, ao contrário do que acontece nas escolas tradicionais, os pequenos alunos costumam adorar as aulas, que privilegiam o aspecto lúdico da educação, mesmo para jovens e adultos.
Para a professora Jucilene Machado, o mérito dessa estratégia reside no fato de que todo o conhecimento é construído com o aluno, levando em consideração a condição de saúde e a história de vida de cada um. “Trabalhamos as dificuldades individuais e as demandas individuais”, esclarece, ressaltando que as classes funcionam em dois turnos, das 8h às 11h e das 13h às 17h, de segunda a sexta.
As crianças podem começar a frequentar a classe aos 4 anos, desde que liberadas pela equipe médica e com a autorização dos pais. Os pacientes que não podem sair dos leitos, mas que possuem condições e desejo de participar, como foi o caso de Maria Clara, recebem a visita dos professores para uma aula ou para sanar alguma dúvida de alguma atividade sugerida.
A professora Lidiane Moreira explica que alunos que precisam de reforço ou recebem atividades das suas escolas também contam com o apoio do projeto, de modo que o período de internamento não representa uma grande perda na vida escolar do estudante. “O planejamento é flexível e, no período da alta, os alunos recebem um parecer descritivo das atividades trabalhadas e uma declaração de presença que são validadas pelas escolas de origem”, pontua.
No Programa Classe Hospitalar, um dia da semana, os alunos têm aulas de música. Segundo um dos professores da área, Eudes Cunha, a experiência é desafiadora para os professores, pois as realidades enfrentadas por alunos e professores são duras e não são raras as situações em que o processo é interrompido pela morte de alguém.
“Mas é muito gratificante proporcionar o prazer que a música traz para as vidas dessas pessoas e isso vai muito além do processo de ensino e aprendizagem”, conta.A coordenadora do Serviço Social do HSR, Viviane Cerqueira, confirma que o paciente da Classe Hospitalar costuma apresentar uma melhora significativa do quadro clínico. “A escola reduz o espaço da dor e da reclusão, minimiza a saudade”, finaliza.