Há cerca de dez anos atrás, o Brasil firmava – através do Ministério da Educação (MEC) – um de seus documentos norteadores no sentido de orientar a política nacional de educação especial e o atendimento de alunos com deficiência nos sistemas de ensino. Em acordo com iniciativas nacionais e internacionais que remontavam à Declaração de Salamanca, resolução das Nações Unidas firmada em 1994 que visava a padronização e equalização das oportunidades de acesso à educação de pessoas com deficiência em todo o mundo, o Brasil dava um passo a mais na vontade política de estabelecer o critério inclusivo como fundamento da educação especial. Em 2008, antes mesmo de que o Congresso Nacional adotasse com força de emenda constitucional a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu protocolo facultativo e de que se instituísse após longo trâmite a Lei Brasileira de Inclusão, o governo federal publicava o documento da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva em acordo com as recomendações de Salamanca e sedimentando a noção de uma escola para todos com o aporte da educação especial complementar ou suplementar, conforme mais tarde o marco legal viria apenas confirmar.
Além de delimitar o público alvo da educação especial, organizar os sistemas de ensino e procurar orientá-los no sentido de promover respostas às necessidades educacionais de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas escolas regulares, o documento também passou a organizar o atendimento em educação especial a partir da mesma política pedagógica das escolas regulares. Desta forma, a ação transversal da educação especial passou a ocorrer a partir do atendimento educacional especializado, serviço oferecido pela rede regular ou entidades conveniadas, posteriormente regulamentado pela Resolução MEC CNE/CEB nº 4, em 2009, e pelo Dec. 7.611, de 2011. Do ponto de vista de financiamento da política, os recursos destinados a aprimorar o atendimento especializado e a providenciar investimentos em formação e adequações quanto à acessibilidade e outros aspectos materiais continuavam a depender quase totalmente de fundos públicos, especialmente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, regulamentado pela Lei n. 11.494 e pelo Dec. 6.253, ambos de 2007, e também pelo já citado Dec. 7.611, de 2011.
Recentemente, passada a década em que ocorreu a maior expansão já verificada de matrículas de estudantes com deficiência em escolas regulares (ver gráfico abaixo), o MEC, através da atual gestão da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI), tomou a iniciativa de provocar um primeiro movimento no sentido de avaliar e atualizar a Política Nacional de Educação Especial. Em pleno decurso de ano eleitoral e dentro de um governo de transição política, é muito possível que quaisquer efeitos da tal revisão venham a recair para uma equipe a ser formada no âmbito do próximo governo, em um contexto imprevisível. Mesmo assim, no último dia 16/04, em reunião para a qual foram convidadas algumas das principais entidades relacionadas à educação voltada às pessoas com deficiência, a equipe liderada pela secretária Ivana Siqueira e pela diretora de políticas de educação especial, Patrícia Raposo, deflagrou o que pretende ser o primeiro passo de uma proposta de atualização da política nacional.
Fonte: Censo Escolar da Educação Básica. Inep/MEC. 1998 a 2017
Na reunião, apresentaram-se algumas linhas de um diagnóstico da realidade da educação especial no Brasil e também as linhas gerais da proposta. Além disso, foram expressas as preocupações e propostas das entidades presentes que deverão ser discutidas com a sociedade através de consulta pública que brevemente será disponibilizada pela pasta e incorporadas no documento final. O documento base preparado pela equipe do MEC e utilizado na reunião, com alguns dados deste diagnóstico, pode ser acessado na internet.
Atualização do documento, avaliação da realidade
Em linhas gerais, os dois eixos principais da busca pela atualização da política nacional de educação especial neste momento parecem ser a atualização da política conforme a legislação ulterior e a necessidade de avaliar a realidade em que vem ocorrendo o atendimento educacional no último período. Importa ressaltar ainda o imenso impacto que a crise política e econômica exerceu durante a última década tanto no orçamento destinado à educação como um todo quanto a instabilidade política afetou a continuidade de inúmeros programas governamentais.
Ainda assim, mesmo diante de um cenário ainda bastante impreciso de recuperação econômica e estabilidade política precária, sempre é desejável que a realidade presente esteja sendo avaliada. No que diz respeito à educação, infelizmente os dados a cotejar são muito precários, quase essencialmente numéricos e obtidos invariavelmente da mesma fonte: o Censo Escolar executado e elaborado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (INEP).
Do ponto de vista qualitativo, muito embora tenham sido ensaiadas algumas iniciativas no bojo do mais recente Plano Nacional de Educação (PNE), como, por exemplo, o Observatório do PNE, iniciativa capitaneada por dezenas de entidades civis e públicas, nem ao menos um informe qualitativo a respeito do atendimento dedicado aos estudantes com deficiência foi gerado em todo o período, o que é muito sintomático da desorganização estatística e da informalidade que ainda hoje prospera no que se refere a indicadores sociais precisos sobre educação amplo senso.
Coincidindo com a flexibilidade que a legislação a respeito dos recursos do FUNDEB permite aos entes administrativos no investimento dos recursos entre as diversas etapas e modalidades e o muito precário controle social sobre os reais investimentos, qualquer cenário diagnóstico acaba por recair em uma grande dose de subjetividade. Ocorre que a educação incide sobre pessoas e não números, e é sobre sua realidade objetiva que devem recair as preocupações de quem advoga em seu nome e a quem é atribuição atender.
Deste modo, ainda que seja razoável admitir que existe um cenário de desinvestimento no qual a pasta da educação vem sofrendo cortes pelo menos desde o ajuste fiscal de 2015, não deve ser muito difícil perceber-se as dificuldades que enfrentam os executores finais das políticas governamentais, isto é, as próprias comunidades escolares. Porém, trata-se exatamente de quem mais necessita de aporte e a quem efetivamente cabe executar o escopo das políticas de governo. Parece injusto, portanto, que muitas vezes se deposite a culpa final dos desvios e dificuldades reais do processo inclusivo justamente nos elos mais fracos da corrente: os professores e o corpo discente das escolas. Neste ponto, avaliações que visem melhorar as condições reais das escolas são bem vindas, principalmente se não representarem inflexões ao passado, quando o direito à inclusão não passava de mera aspiração, e nem incorrerem em políticas discrepantes aos compromissos assumidos pelos poderes de Estado em observar e garantir o direito à educação em ambientes inclusivos.
Consulta pública
Ainda sem data marcada, a consulta pública deverá ocorrer a partir do sistema de consultas públicas no website do MEC, onde deverão constar documentos orientadores, a íntegra da proposta bem como as contribuições preliminares das entidades que participaram preliminarmente das reuniões, conforme ocorreu em outras consultas, tais como a consulta sobre as Orientações Curriculares Nacionais da Educação Infantil e a Base Nacional Comum Curricular
Informações poderão ser obtidas junto à SECADI/MEC – Esplanada dos Ministérios, Bl. “L” – 2º Andar – Gabinete | 70047-900 – Brasília – DF | Fone: (61) 2022 9217 / 9018 | E-mail: secadi@mec.gov.br
Outras informações poderão ser obtidas junto às entidades que participaram da primeira reunião ocorrida em 16/04:
CONSED – Conselho Nacional de Secretários de Educação
SDS/CONIC – Ed. Boulevard Center, Sala 501, , BRASILIA – DF – Centro CEP: 70.391-900 | faleconosco@consed.org.br
UNDIME – União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação
SCS – Q. 6 Bloco A. Edifício Carioca – Salas 611/613 | CEP: 70325-900 – Brasília / DF | Telefone/Fax: (61) 3037-7888 | undimenacional@undime.org.br
SNDPD – Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência
Setor Comercial Sul – B, Quadra 9, Lote C, Edifício Parque Cidade Corporate, Torre “A”, 8º andar
CEP: 70308-200, Brasília, Distrito Federal, Brasil | Telefones: +55 (61) 2027-3684, 2027-3221 | E-mail: pessoacomdeficiencia@sdh.gov.br
CONADE – Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência
Setor Comercial Sul – B, Quadra 9, Lote C, Edifício Parque Cidade Corporate, Torre “A”, 8º andar
CEP: 70308-200, Brasília, Distrito Federal, Brasil | Telefones: +55 (61) 2027-3684, 2027-3221 | E-mail: pessoacomdeficiencia@sdh.gov.br
ConBraSD – Conselho Brasileiro para Superdotação
E-mail: faleconosco@conbrasd.org
CRPD – Comitê Brasileiro de Organizações Representativas das Pessoas com Deficiência
https://apaebrasil.org.br/noticia/67520
ONCB – Organização Nacional de Cegos do Brasil
Escritório Brasília – SCS Quadra 1 – Bloco B – Sala 307 | Brasília – DF | Cep: 70308-900 |
Telefone: (61) 3041-8288 | E-mail: brasilia@oncb.org.br
FBASD – Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down
CRS 507, BLOCO B, LOJA 67, ASA SUL, CEP 70351-520 – Brasília – DF | Tel: 19-33959260 (de 08:00 às 14:00) | federacaodown@federacaodown.org.br
FENAPESTALOZZI – Federação Nacional das Associações Pestalozzi
SRTVS Qd. 701, Nº 110, Bloco O, Centro Multi Empresarial, Salas 496 e 497, CEP 70.340-000, Asa Sul, Brasília – DF | +55 (61) 3224-5620 | E-mail: comunicacao@fenapestalozzi.org.br
FENAPAES – Federação Nacional das Apaes
SDS Venâncio IV Cobertura CEP: 70393900 – Brasília/DF | Telefone: (61) 32249922 | E-mail: fenapaes@apaebrasil.org.br
IBC – Instituto Benjamin Constant
Av. Pasteur, 350 / 368 – Urca | Rio de Janeiro – RJ | CEP: 22.290-240 – Brasil | Telefone | (21) 3478-4442 | E-mail: ibc@ibc.gov.br
INES – Instituto Nacional de Educação de Surdos
R. das Laranjeiras, 232 – Laranjeiras, Rio de Janeiro – RJ, 22240-003 | Telefone: (21) 2285-7546 | E-mail: dirge@ines.gov.br
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Fonte: Inclusive – Inclusão e Cidadania
Desde o ano de 2001 tenho acompanhado o processo da Politica de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, inclusive Coordenei o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade no Polo de Campina Grande-PB e 59 Municipios da Area de Abrangência do referido pólo.Portanto, tenho grande interesse em continuar participando deste processo rumo as novas discussões…Obrigada!
Eu acho essa atualização um retrocesso para a Educação Especial. Não podemos voltar ao assistencialismo e é isso que essa atualização vai fazer. Não podemos deixar!!!!!!!
Como a inclusão social é uma política de Estado ancorada em tratados internacionais, não pode ser desmontada sem um amplo debate com a sociedade e com especialistas da área (Professores).