Mediador não é professor particular

Mediadores e Mediadoras do Projeto Roma:

Como “fazer pontes” cognitivas entre os
contextos?

O PAPEL DAS MEDIADORAS E DOS MEDIADORES NO PROJETO ROMA.

A pessoa mediadora, como facilitadora da aprendizagem nos contextos
familiar, escolar e social, é o elo ou ponte de informação e união entre
estes contextos. Se pretende criar espaços de reflexão conjunta para
produzir a melhora qualitativa de tais contextos, sendo o trabalho
cooperativo a cultura que impera no Projeto Roma.

A função, como bem descreve a palavra, é a da pessoa que media entre os
pais, a escola e o Projeto Roma. Tentamos que nosso trabalho principal
consista em que as mães e pais, o restante dos familiares, professores e
todas aquelas pessoas envolvidas educativamente com nossos meninos e
meninas, tenha a consciência de que a finalidade do Projeto Roma é ensinar
estratégias cognitivas.

O papel do mediador tem avançado progressivamente. No início éramos mais
orientadores que outra coisa; orientávamos à família em certos temas; agora
intervimos e trabalhamos com ela e com o menino ou a menina, não como
professor particular, mas sim observando nossas atitudes, podendo
estabelecer um diálogo sobre as aprendizagens mais significativas e a
maneira de abordá-las, criando novas estratégias de aprendizagem em função
da demanda dos pais e professores.

No âmbito familiar, o mediador ou mediadora convida pais e mães para
analisar diversas situações, além disso lhes estimulam para que aumentem os
envolvimentos em cada situação e contexto e que as diferentes intervenções
de seu filho/ filha sejam mais fundamentadas numa recapacitação comum
através de experiências quotidianas, sobre as que antes não se havia
pensado, valorizando desta forma seu poder educativo. Muitos dos
assessoramentos que se costumam fazer em casa são para a resolução dos
problemas diários, propiciando a cada um dos meninos e meninas sua própria
autonomia e o aumento progressivo de sua responsabilidade no lar. Resumindo,
tentamos ajudar com que a filosofia do Projeto Roma se concretize, embora
são eles e elas, muitas vezes, que nos apoiam de cara a entender e valorizar
esta filosofia e prosseguir com ela.

Desta consciência que se despertou nos pais, como agentes fundamentais na
educação de seus filhos e filhas, o Projeto, e em parte através de nossa
ação mediadora, lhes tem inspirado confiança e tem modificado suas atitudes
em relação a sua capacidade como educadores, assim como em relação à
capacidade como aprendizes de seus filhos/ filhas e tem feito que eles
mesmos, empapados desta nova filosofia, desenvolvam constantemente novas
estratégias de intervenção educativa em contextos naturais, contribuindo,
assim, para seu desenvolvimento como pessoas e como pais.

Temos permanecido atentos às demandas das pessoas implicadas e
responsabilidades da educação de meninos/ meninas, para apoiar e guiar o
desenvolvimento e aplicação de “estratégias para aprender a aprender”, com
uma finalidade sempre presente: que se façam competentes para desenvolver- se
de forma adequada e autônoma nos distintos hábitos, casa, escola, bairro,
etc., tanto no momento atual como no futuro que previsivelmente tem que
escolher.

No contexto social, lhes estimula provocar situações nas quais se dêem
relações com as pessoas ao seu redor e que saibam desenvolver- se de forma
espontânea em um contexto que irá, progressivamente, se abrindo desde o mais
próximo até outros cada vez mais amplos.

No contexto escolar, o papel do mediador consiste em manter uma relação
constante, tentando que o discurso e a metodologia do Projeto penetre nos
docentes e na instituição escolar e que se inclua no currículo comum, dando
uma assistência no desenvolvimento dos processos de atenção, processamento,
planejamento e na resolução de problemas da vida quotidiana. Tem-se tentado
introduzir o Projeto para que, pouco a pouco, sejam produzidas mudanças,
mudanças que não somente favoreçam aos alunos e alunas com hándcap, mas que
transformarão a prática educativa produzindo-se uma melhora da mesma para
todos e todas as alunas e alunos dos centros. Com este modo de trabalho,
pensamos que a escola como organização social e a própria sociedade
melhorarão em qualidade de vida, pois o que se pretende com o Projeto é
conhecer, compreender e transformar os referencias da escola atual, buscando
uma escola de qualidade. Não é um Projeto exclusivamente para pessoas com
Síndrome de Down, e sim um projeto com a intenção de criar uma nova escola.

Na maioria de nossos casos, esta mensagem não tinha tido muito eco, talvez
por falsos temores ou por um convencimento de antemão, tanto na competência
cognitiva das pessoas com Síndrome de Down como na necessidade da mudança da
prática educativa até uma educação que atenda a todos e cada um dos alunos e
alunas diferentes que constituem nossos centros educativos, buscando uma
escola que parta das desigualdades e não das igualdades entre seres humanos,
uma escola compreensiva e não seletiva. Embora não se tenham conseguido
grandes lucros na maioria dos nossos casos neste contexto, pelo menos, se
tem tentado e de fato alguma mudança se tem conseguido.

Algumas das dificuldades que nós encontramos é que em numerosas ocasiões não
nos faz nenhuma demanda por parte do centro educativo ou da família, ainda
quando se pode pressupor a existência de algum outro problema. Neste caso, o
que se costuma fazer é provocar tal demanda propondo nos diálogos pontos
temáticos nos quais previsivelmente podem surgir conflitos. Outra das
grandes dificuldades que a maioria das pessoas mediadoras encontram é que o
contexto escolar, no geral, tem se mostrado muito fechado. Embora que tenha
se comentado aos professores que supunham um benefício para sua própria
prática educativa e que não envolvia nenhuma imposição nem carga emocional
na sua tarefa educativa, são captados, freqüentemente, certos temores e
receios, e a desculpa de pouca disponibilidade de tempo é encontrada em
muitas ocasiões. Nós queremos desempenhar um papel afetivo e emocional,
tentando incutir nos pais e professores confiança e segurança para enfrentar
a educação dos meninos e meninas, e que desfrutem de seu desempenho.

No âmbito familiar, em geral, sempre esteve bastante aberto a nossa
intervenção, do modo que se tem trabalhado melhor neste contexto e através
deste trabalhado o contexto social, contexto, este, mais difícil e mais
enriquecedor, já que por um lado garantia um menor grau de controle por
parte dos pais e mães, mas por outro, garantia processos que envolviam um
maior desenvolvimento da autonomia de seus filhos e filhas.

Um dos grandes ganhos tem sido a criação de recursos alternativos com a
família, tanto em relação a um melhor desenvolvimento cognitivo como também
no referente às relações sociais e ao desenvolvimento da autonomia.

Relação com os pais.

Poderíamos englobar os seguintes compartimentos:

a) No início, tínhamos pouca segurança no nosso trabalho e como atuar, coisa
que se transmitiu aos pais e profissionais. Graças ao Projeto e amigos,
temos nos envolvido cada vez mais, obtendo uma relação mais próxima. Temos
uma maior segurança e acreditamos no que fazemos com muita ilusão, embora
sempre temos que continuar investigando e nos informando, abertos à todos
tipos de possibilidades.

b) Outro dos sentimentos dentro da relação com os pais é que ao nos
incorporarmos , nos parece que eles sabem de tudo e que nós não podemos
contribuir com nada. Mas pouco a pouco, temos ido intercambiando roles,
“todos temos que aprender de todos”, não existe ninguém que tenha a verdade
absoluta, trocando conhecimentos chegaremos ao longe.

c) Havia uma grande distância entre os pais e o mediador, já que havia um
grande respeito entre nós. Alguns pensam que o mediador é imprescindível e
que não se pode continuar sem ele, porque somos os que possuem o
conhecimento. Mas felizmente, o trabalho diário com seus filhos, lhes tem
proporcionado mais segurança e confiança neles mesmos, propiciando assim sua
atuação.

Em geral, aprendemos muito dos pais em relação a sua dinâmica de trabalho em
casa. Tudo isso não está em textos, e sim à nossa volta, temos que
aproveitar as situações que nos oferece a vida quotidiana e transformá-las
em educativas para uma melhor relação e entendimento em nosso contexto e
desenvolvimento pleno nas atividades diárias, tomando o ambiente como
laboratório.

Temos desempenhado o papel de intermediários entre os coordenadores da
investigação e os pais, tentando proporcionar uma visão mais objetiva que a
dos próprios pais, sobre o desenvolvimento de seus filhos/ filhas,
dificuldades, a aplicação dos distintos projetos encaminhados até a melhora
dos déficits sócio – cognitivos e informado sobre a complexidade dos
contextos familiar e escolar.

Pensamos que se tem conseguido satisfazer as demandas dos pais e mães
refletindo e tratando de maneira conjunta o que seria mais conveniente em
cada situação. Embora em outras ocasiões, estas tratavam sobre o contexto
escolar e tem sido difícil ou impossível, a não dar a este contexto muitas
oportunidades para tentá-lo ou conseguí-lo. Às vezes, no contexto familiar
e social tem-se podido delinear as necessidades delineadas, ao se produzir
contra – indicações nos mesmos pais ou mães; por exemplo: é muito comum
querer que um filho ou filha seja autônomo ou autônoma, mas, por outro lado,
é maior o medo de deixar-lhe sair para qualquer lugar ou deixar-lhe que
vista desta ou daquela maneira.

As pessoas mediadoras, de certo modo, contribuem para abrir espaços para
melhorar a educação familiar ao fomentar o convencimento por parte da
família na competência cognitiva das pessoas com Síndrome de Down e ao
verificar, junto aos membros da família, muitos processos que acreditavam
que não iam conseguir abordar com seus filhos e filhas. Tratamos de
convencer-lhes de que qualquer situação quotidiana é aproveitável para a
educação e para a satisfação desta ou daquela demanda, sem ter que recorrer
à técnicas terapêuticas.

Pretendemos que se considere a pessoa com Síndrome de Down, como um filho ou
filha mais que, portanto, tem que assumir responsabilidades como qualquer
outro membro da família. Deste modo, tentamos fazer que os pais e mães vejam
que a linguagem é fundamental como veículo socializador e de desenvolvimento
cognitivo, que tem que deixar fazer a menina ou o menino e que, de antemão,
não podemos julgar sem provocar esta ou aquela experiência. Que são seus
filhos e filhas e que se tem que envolver eles e elas primeiro como pais e
mães, já que é enorme a importância de seu papel no processo de aprendizagem
de seus filhos e filhas.

Em relação à nossa contribuição da melhora do currículo escolar, temos que
destacar alguns aspectos como: o estímulo da consideração do valor dos
conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais por igual. Mesmo assim,
normalmente, se tem dado muito mais importância aos conceituais,
deteriorando os procedimentais e atitudinais. O Projeto Roma se baseia na
idéia de que é muito melhor realizar uma meta – aprendizagem que te leva a
uma mudança de atitudes em vez de acumular conceitos como se se tratasse de
uma enciclopédia.

A consideração da importância de ensinar a pensar e a proceder para que se
produza uma maior generalização a outras novas situações, acima do acúmulo
de conceitos concretos ou a realização, de forma perfeccionista, de tarefas
ou temas fixos. É muito mais importante o processo do que os resultados.

Além disso, estimulamos a oferta de um mesmo currículo para todos e todas e
não a de currículos paralelos que criam uma “subcultura” em palavras de
Miguel López Melero, em vez de ajudar na reconstrução de um patrimônio de
cultura comum.

Nos contextos familiar e social, nos tem sido permitido alimentar o
desenvolvimento da aprendizagem cooperativa. No contexto escolar, do mesmo
modo, se tem confundido muitas vezes o estar agrupados com o trabalhar
cooperativamente, sendo um abismo o espaço que diferencia estes dois modelos
de ensino e aprendizagem.

Do nosso próprio ponto de vista, temos observado que em todos os casos tem
havido uma evolução em nossos meninos e meninas, tanto em relação às
competências cognitivas produzindo-se uma melhora na linguagem (tanto
expressiva como funcional e de nível socializador) , assim como em relação à
representação mental, de planejamento, de leitura – escrita, de resolução de
problemas, de atenção e de memória e de generalização do conhecimento de
novas situações que surgem nos diferentes contextos.

Em relação às competências afetivo – sociais, também observamos uma grande
evolução em suas condutas tanto em nível social como de assertividade (saber
como conseguir algo) e, sobretudo, no referente ao desenvolvimento da
própria autônomia.

A formação que o Projeto Roma contribui aos mediadores poderia se sintetizar
assim: tem ocasionado uma nova filosofia de ensino e uma nova maneira de
enfocar a prática educativa; tem dado a oportunidade de ajudar a dar
soluções aos problemas com os quais, ainda hoje em dia, as pessoas com
Síndrome de Down têm que enfrentar; tem-se visto que se pode aprender de
qualquer situação e que não se deve desperdiçá-la; também tem contribuído
para que valorizemos, desde o princípio, a leitura – escrita como base de
acesso à cultura e a importância de trabalhar os processos de atenção,
memória, percepção, etc.

Avaliamos nossa participação no Projeto Roma como uma experiência muito
positiva, tanto do ponto de vista pessoal como profissional.

Pessoalmente, nos tem oferecido a oportunidade de progredir em nosso
desenvolvimento como pessoa, permitindo fazer-nos participantes e solidários
com uma problemática e meta atual, a integração plena na sociedade das
pessoas diferentes as quais chamamos de “normais”. Sem a intenção de sermos
pretenciosos e a pequena escala, nos tem convertido em agentes de troca
social, sendo nosso trabalho um êxito total no meio das famílias, em alguns
contextos sociais próximos às famílias e não tanto nas instituições,
sobretudo a escolar.

O desenvolvimento, aplicação e avaliação do Projeto potencializou em nós o
desenvolvimento simultâneo de nossas capacidades de planejamento e reflexão,
tornando-nos mais maduros na criação e prática de estratégias aplicadas à
resolução de problemas da vida quotidiana.

Também nossa participação no Projeto Roma nos abriu um campo de relações
interpessoais de valor incalculável. Estreitou os vínculos com os que já
eram nossos amigos, em quase todos os casos, os pais, permitindo-nos um
maior conhecimento, admiração e trabalho conjunto. Em relação aos outros
mediadores de nosso “Estado”, temos iniciado relações de amizade e
companheirismo muito enriquecedoras. Com respeito às outras pessoas de
outros “Estados” nos têm aberto caminhos que nem suspeitávamos, nos
encontrando com pessoas muito diferentes unidas por um projeto comum, nos
permitindo falar num mesmo idioma frente a uma mesma problemática. E no que
se refere à Universidade, temos sentido-a mais próxima e viva, em contato
com a realidade.

Para os profissionais do ensino, temos visto a possibilidade de realizar uma
educação e escola ideais, na qual pais, professores e outros envolvidos,
possam exercer um trabalho conjunto para conseguir o desenvolvimento máximo
da personalidade dos meninos/ meninas, nos constituindo em comunidade
educativa onde todos, independentemente de sua realidade, encontram
capacidade e igualdade de oportunidades. Por este ideal se tem lutado e
agora, através do Projeto Roma, têm encontrado pessoas que participam e vêem
sua realização mais possível, apesar das múltiplas dificuldades encontradas.

Em relação à dinâmica de trabalho do grupo de mediadores e mediadoras, se
tem baseado, fundamentalmente, em reuniões semanais de cada uma destas
pessoas com as famílias de seu caso concreto e, nos casos que têm sido
possível, com os professores e professoras nos centros educativos. Nestas
reuniões se refletiam conjuntamente sobre o processo e que tentavam dar
respostas às demandas surgidas em cada uma das situações e casos concretos.
Mesmo assim, é preciso trabalhar junto com os outros mediadores e
mediadoras, para estabelecer deste modo uma série de cargos em comum, onde
possamos traçar nossos próprios problemas, dúvidas, preocupações e ganhos.
Desta maneira, podemos nos ajudar e nos movimentar para seguir adiante com
nossos propósitos.

Finalmente, em relação à nossa função, como conseqüência do melhor
entendimento da filosofia do Projeto Roma ao longo de sua evolução, tem sido
cada vez mais definida.

Em síntese, a pessoa mediadora no Projeto Roma é a ajuda permanente nos
contextos familiares e escolares; é a que tem possibilitado através das
observações em tais contextos, orientar, organizar e propor alternativas de
trabalho (projetos específicos), para que tanto pais e mães, professores e
professoras como meninos e meninas, aprendam a aprender.

Estas orientações estão determinadas em função das necessidades dos
contextos. Não tem que oferecer nem mais nem menos ajuda que cada contexto
determinado precisa. Quero dizer, é um processo de reconstrução permanente
no sentido vigotskiano.

Simplesmente, os mediadores e mediadoras são aquelas pessoas que sabem abrir
espaços para a aprendizagem e para desenvolver processos que ajudem a
resolver problemas de vida quotidiana das pessoas com Síndrome de Down.

Free Hit Counter

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *