A prática da mediação e a inclusão escolar

Autores: Guga Dorea e Luciana Meirelles

Partindo do princípio de que a complexidade atual das relações sociais e interpessoais no mundo contemporâneo vêm trazendo aos profissionais da educação novos desafios na esfera do ensino, esse artigo pretende reunir alguns pressupostos sobre a intitulada educação inclusiva. Como se trata de uma prática cada vez mais constante nos mais diferentes contextos, convidamos o leitor a pensar conosco os possíveis impasses a serem enfrentados, refletindo sobre  valores que favoreçam o exercício do diálogo e da cooperação.

Nosso desejo é compartilhar idéias surgidas durante oficinas que temos realizado como dois profissionais atuando em diferentes áreas do conhecimento humano. Temos trabalhado na formação de professores, aperfeiçoando nossa parceria e praticando a idéia de que conhecimento não é algo que as pessoas possuem em suas mentes e sim que ele é construído a partir do que podemos chamar de práticas relacionais.

É na prática da mediação que temos encontrado ferramentas úteis para o  trabalho com educadores, pois o mediador exerce a função de facilitador de diálogos entre a escola, a família e a comunidade, acreditando sempre, como já afirmou, por exemplo, a teoria construtivista social, na competência dos indivíduos para administrar as suas próprias dificuldades,  deliberar sobre situações complexas e buscar soluções criativas para conflitos e dúvidas.

Sabendo que no ambiente escolar ocorrem as mais diversas inter-relações, procuramos sempre atuar como parceiros, interagindo na diversidade, conciliando interesses e emoções, sempre experimentando o valor construtivo da reflexão como geradora de práticas inclusivas. Trabalhar com esse tema, dentro de uma visão interdisciplinar, tem significado para nós compreender e decodificar conceitos, além de enfrentarmos as incertezas do cotidiano de maneira investigativa e interacional, concebendo o educar como um saber em ação e não estático e apenas conteudista.

Estamos interessados em formar mais do que informar procurando reforçar a idéia de que só podemos compreender  e construir atitudes inclusivas a partir das diferenças humanas e não da homogeneidade,  o que significa ouvir, refletir, perguntar, se aperceber, colaborar  e investigar no âmbito da sala de aula e fora dela.

O objetivo básico das oficinas é, antes de tudo, conhecer empiricamente o que os educadores têm como subjacente à idéia de uma escola para todos e como seus alunos podem estar sendo inseridos nesse contexto inclusivo. Abordamos  ainda como os educadores concebem o que é ser igual e diferente nessa complexa sociedade em que vivemos, além de contemplar como eles visualizam a dicotomia produzida histórica e culturalmente que sempre dividiu os seres humanos em “normais” e “anormais”.

Colegas de classe auxiliam Rita de Cássia (deficiente visual) com as atividades. Foto: Roberto Ortega
Na foto, colegas de classe auxiliam Rita de Cássia (deficiente visual) com as atividades. Foto: Roberto Ortega

Sabendo que surgirão narrativas construídas a partir de experiências vividas em função de concepções e valores produzidos culturalmente, levando-se sempre em consideração contextos sociais, históricos e filosóficos, as oficinas proporcionam a possibilidade de verificar empiricamente se os educadores estão buscando modificar e reinventar o que Deleuze, inspirado em Espinosa, chamaria de novas maneiras de ser e de agir tanto no âmbito da escola como no contexto social – incluindo aí uma salutar parceria com as famílias – ou se estão reproduzindo o discurso da adequação uniformizante e normalizante.

Os mediadores estarão aptos então a detectar quais subjetividades e vínculos afetivos estão sendo construídos nas relações professor/aluno, tendo sempre como foco as diferenças humanas. Poderemos, dessa forma, intervir para que paradigmas e pré-conceitos sejam rompidos em nome de uma educação realmente para todos.

Em linhas gerais, não trabalhamos com  fórmulas prontas e sim de maneira processual treinando habilidades para que cada educador crie caminhos próprios em sua atuação. A hipótese que pretendemos desenvolver é a de que cada aluno, com deficiência ou não, é sempre um importante disparador de reflexões, trazendo a oportunidade permanente para que todos nós continuemos a aprender e a  re-orientar nossas práticas de ensino, configurando-se em uma possibilidade concreta para que a escola pratique de fato a inclusão social, ou melhor dizendo, a educação para todos, sem exclusões e hierarquizações.

________________________________________________________________________________________

Sobre os autores:

Guga Dorea é Jornalista e doutor em Sociologia. Atua hoje em dia como professor de cursos de pós-graduação em Educação Inclusiva e do curso de especialização em síndrome de Down, organizado pelo Centro de Estudos e Pesquisas Clínicas (CEPEC), além de pesquisador e articulista nas áreas social, educacional e inclusiva. É também integrante do Instituto Futuro Educação, uma entidade sem fins lucrativos que tem como forma de atuação projetar e propor cursos, seminários e oficinas que abrangem desde a filosofia e a sociologia da diferença até a educação democrática e inclusiva. Contato: gugadorea@uol.com.br

Luciana Meireles é psicóloga clínica, atuando com adolescentes, adultos,  casais e famílias, além de pedagoga, psicoterapeuta e mediadora de conflitos pelo Instituto Familiae, entre outras instituições.Contato: lucianaeme@uol.com.br

2 Comments

  1. Gostei muito do artigo e penso que não há mesmo receita e o caminha é explorar as várias inteligências para descobrirmos a rota que pode levar o aluno a ter acessibilibdade ao conhecimento.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *