Criação de um sistema nacional de gestão está entre as prioridades de conferência que tem início no sábado e definirá os rumos do ensino público brasileiro na próxima década
Tão antiga quanto controversa, a construção de um Sistema Nacional de Educação, nos moldes do Sistema Único de Saúde, para comparar com um arranjo institucional existente no país, volta à agenda de debates. Esse será o tema central da Conferência Nacional de Educação, que começa em Brasília no próximo sábado, de onde sairão as diretrizes para o ensino público no país nos próximos 10 anos.
Para subsidiar a discussão, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) lança nesta terça-feira (23/3) a publicação Educação e Federalismo no Brasil: combater as desigualdades, garantir a diversidade.
Sem se posicionar sobre uma eventual revisão das responsabilidades de cada ente federativo no que diz respeito à oferta educativa, o livro traz um estudo dos obstáculos do atual modelo e revela como 10 países se organizam na área. Todas as nações analisadas seguem o modelo federativo de organização.
O resultado mostrou que o arranjo institucional do Brasil na oferta da Educação é similar ao da maioria dos países, com responsabilidades divididas entre o governo federal, estados e municípios. São eles: Argentina, Espanha, México, África do Sul, Austrália e Índia.
A Alemanha foi a única nação em que as instâncias regionais, cada uma com um Ministério da Educação, têm praticamente todo o poder de decisão. Mais descentralizados estão os sistemas dos EUA e do Canadá. Neste último país, não há sequer órgão da administração central. São colegiados locais – como distritos e juntas Escolares – que definem a oferta e o modelo de Educação.
Para Wagner Santana, oficial de projetos da Unesco, fica claro que na maior parte dos regimes federativos no mundo há compartilhamento de funções. “Uns com maior e outros com menor grau de centralização. O importante, para nossa realidade, não é fazer ou não um sistema único. O essencial é efetivar os mecanismos de cooperação”, afirma.
Para ele, instrumentos já utilizados na gestão da Saúde, que se organiza de forma unificada, podem ser interessantes. “O organismo tripartite, com representação nacional, estadual e municipal para definição de ações comuns, seria uma boa medida. Hoje, o Conselho Nacional de Educação, que deveria fazer esse papel, está subordinado ao Ministério da Educação”, critica. A pasta foi procurada, mas não se manifestou.
Hierarquia
O deputado Carlos Abicalil (PT-MT), um dos autores da publicação, defende uma revisão de atribuições caso a caso. “É compreensível que o município de São Paulo, por exemplo, mantenha um sistema educacional consolidado, mas como exigir o mesmo de um município no interior do Amazonas, que não tem sequer mão de obra treinada?” A hierarquia utilizada na gestão da Saúde, que classifica os municípios como plenos, semiplenos, dependentes, entre outros critérios, poderia ser replicada para a Educação, segundo o parlamentar.
Ele destaca Mato Grosso como único estado que já começou a formação de uma gestão integrada. “Aos poucos isso tem sido implementado, na mentalidade da colaboração”, afirma.
Um novo marco no sistema educacional poderia acabar com a resistência de estados e municípios de cumprir leis como a do piso nacional para professores. “É por esse e outros motivos que sempre vem a questão da autonomia quando se faz esse debate”, pondera Santana.
Cada um na sua
Pela Constituição, municípios devem oferecer a Educação infantil e Educação fundamental, ou seja, da creche ao atual 9º ano. Os estados são responsáveis pelo ensino médio. E a União, além das funções normativas gerais, cuida da Educação superior e do ensino tecnológico. O problema é que as funções nem sempre se alinham à disponibilidade de recursos e à capacidade de gestão dos entes federativos.
(Renata Mariz)
(Correio Braziliense, 23/3)
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Fonte: Jornal da Ciência