Por Gilberto Dimenstein *
Diante da questão que está no título da coluna, 15% dos americanos disseram que prefeririam ser cegos a ser obesos; 25% achariam melhor até sofrer uma depressão grave, daquelas que tiram a vontade de sair da cama. Maluquice?
Se você tentar descobrir quanta gente a seu lado não deixa de fumar, arriscando-se a ter um câncer, com medo de engordar, verá como o estigma do peso produziu um distúrbio emocional coletivo. Pesquisadores da Universidade de Yale revelaram, na semana passada, os caminhos da nicotina no cérebro, capazes de explicar por que parar de fumar engorda. Dessa descoberta, surge a possibilidade de transformar a nicotina num medicamento que emagreça sem produzir tumor ou infarto.
Vivendo aqui, nos Estados Unidos, tenho a sensação de que nada parece ameaçar mais os americanos do que a obesidade. Na lista de temores nacionais, o excesso de gordura supera os terroristas, a China e até o desemprego.
Mais um dado revelado na semana passada: um em cada cinco jovens americanos de 22 a 35 anos de idade sofre de hipertensão arterial.
O obeso ganhou o estigma de ser contagioso, assim como já ocorreu com o portador do vírus da Aids ou com o leproso. Não exagero.
Uma pesquisa publicada neste ano por cientistas americanos, depois de muitos anos de observação, mostrou que a obesidade é contagiosa. Se alguém engorda, o padrão tende a disseminar-se entre seus familiares e amigos. Uma possível (e perversa) tradução disso é que se deveria ficar longe dos obesos e, supostamente em nome da saúde pública, discriminá-lo na seleção profissional. Obesos já têm mais dificuldade de conseguir emprego.
Empresas de seguro médico estão discutindo uma taxação especial aos gordos, já que eles representam mais custos.
A epidemia do peso está servindo até para questionar o valor da chamada era da informação, na qual os Estados Unidos imperam com suas encantadoras invenções. Imagina-se que cada invenção digital vire menos calorias queimadas. Assim poderia ser visto o iPad, que produz tanta excitação.
Na semana passada, começou a ser comercializado mais um “revolucionário” aparelho para ler livros, com muito mais recursos. Na contabilidade de calorias, isso significa menos caminhadas até a banca de jornal ou a livraria.
Esse tipo de contabilidade foi para dentro das empresas. Neste mês, foram divulgados estudos atribuindo às facilidades no ambiente de trabalho a responsabilidade pela epidemia de obesidade nos Estados Unidos. Entre elas, o e-mail.
Como já não têm tanta necessidade de se locomoverem para conversar com os colegas de trabalho, as pessoas gastam menos calorias. Uma série de facilidades no escritório convida os empregados a ficarem cada vez mais tempo sentados. As copiadoras ficaram baratas, estão sempre à mão. Dá para compartilhar e reescrever documentos em grupo na tela do computador.
Por dia, segundo os estudos, os americanos deixaram de perder, em média, cerca de 140 calorias por causa das novas tecnologias nos escritórios. Multipliquem-se 140 calorias diárias por dez anos e tem-se aí mais uma explicação, entre várias -como o fast food e o abuso da internet e da televisão-, para o fato de haver um obeso em cada três americanos.
A preocupação vai produzindo as mais diferentes respostas, como a proibição da comercialização de brinquedos embalados com alimentos muito calóricos, o estímulo ao aumento das aulas de educação física nas escolas ou a mudança da alimentação nas escolas.
Aparecem até ideias radicais. Em alguns Estados, está em debate a possibilidade de cobrar um imposto diferenciado de empresas que vendem determinados alimentos (refrigerantes, por exemplo), drenando os recursos para programas que façam as pessoas se mexerem mais.
PS – Se as prefeituras no Brasil ajudassem a conservar e a alargar as calçadas, além, é claro, de melhorar o transporte público, já fariam um belo serviço de civilidade comunitária que estimularia as pessoas a andar a pé. Mais um argumento para os que acham que as cidades devem limitar cada vez mais o tráfego do veículo privado.
* Gilberto Dimenstein é colunista e membro do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo e comentarista da rádio CBN, é fundador da Associação Cidade Escola Aprendiz.
Fonte – Portal Aprendiz