Campanha alerta para uso excessivo de medicamentos para melhorar desempenho na escola

Caixa de medicamentos com tarja preta

Por Carolina Sarres
da Agência Brasil

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados discutiu no último dia 11 o uso excessivo de remédios por crianças e adolescentes com dificuldades de aprendizado ou de comportamento na escola. A reunião marcou o início da campanha Não à Medicalização da Vida, encabeçada pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) e pelo Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade.

De acordo com a conselheira do CFP, Marilene Proença, medicalização é todo tratamento de processos ou comportamentos sociais e culturais em crianças, adolescentes ou adultos com quadro de patologia psiquiátrica. Neste caso, o debate foi sobre o tratamento de distúrbios relacionados à educação — como dislexia, déficit de atenção e hiperatividade.

“Existe uma métrica social que considera sentimentos e comportamentos legítimos como sintomas patológicos. Muitas vezes, esses casos são tratados com os chamados tarja preta, que têm sérias sequelas”, explicou Marilene.

Para a conselheira, há muito alarde em relação a drogas ilícitas, mas pouco em relação às licitas. Foram apresentados dados à comissão que, em 2000, eram consumidas 70 mil caixas de medicamentos para o tratamento de distúrbios relacionados à aprendizagem. Em 2010, o número cresceu para 2 milhões, o que faz do Brasil o segundo maior consumidor desse tipo de remédio, apenas atrás dos Estados Unidos.

“Em vez de melhorarem a qualidade da escola, estão criando instâncias de diagnóstico para crianças que têm dificuldade de aprendizado. Não podemos passar às crianças responsabilidades políticas, sociais e culturais da sociedade em geral”, disse a conselheira do CFP.

Segundo a professora do Departamento de Pediatria da Universidade de Campinas (Unicamp), Maria Aparecida Moisés, substâncias que vêm sendo usadas como “amplificadores cognitivos” — como o metilfenidato (nome comercial: Ritalina) e o clonazepam (nome comercial: Rivotril) — não são drogas seguras.

“São psicotrópicos e tranquilizantes que podem provocar morte súbita e inexplicada até sete vezes mais do que em crianças e adolescentes que não os tomam”, alertou Maria Aparecida.

Para ela, em vez de se discutir a vida e os valores da sociedade, há uma inversão que faz com que todos acreditem que têm transtornos a serem tratados.

“Precisamos adotar uma política educacional que assuma o princípio fundamental de que todos podem e têm o direito de aprender. Um professor é capaz de ensinar toda pessoa a quem se propuser. A medicina fala de impossibilidades. A escola fala de possibilidades. E a escola foi invadida por profissionais de outras áreas, como neuropsicólogos, fonoaudiólogos, psicólogos e psiquiatras. Isso não é escola, mas uma invasão do mercado de trabalho”, disse a professora da Unicamp.

O médico psiquiatra José Miguel Neto, pai de uma criança de 10 anos com problemas de aprendizado, explicou ser a favor do uso de medicamentos, quando indicado.

“Claro que a criança é medicada de acordo com critérios que diagnosticam o problema. O tratamento é multidisciplinar, requer o exame de profissionais de diversas áreas. Não posso entender que os remédios são um diabo que tem de ser exorcizado. Minha filha foi diagnosticada adequadamente, usou a medicação e hoje não usa mais. Só recebe acompanhamento”, explicou o médico.

Para o consultor da Saúde da Criança e do Adolescente do Ministério da Saúde, Ricardo César Carafa, o primeiro passo a ser dado para combater a medicalização é reconhecer que o problema existe e conhecê-lo a fundo.

“Devemos divulgar a medicalização para a sociedade, debater e discutir. Não podemos simplesmente tapar o sol com a peneira, fingir que não existe e que não nos afeta. É necessário trabalhar amplamente com os profissionais de saúde e educação que atendem às crianças para que se adquira o conhecimento necessário”, disse Carafa.

Edição: Fábio Massalli

Fonte: Agência Brasil

3 Comments

  1. O que falta realmente é assistência na Atenção Básica onde toda as crianças sejam avaliadas por uma equipe com experiência em pediatria (terapeuta ocupacional, psicólogo,neuro, psiquiatra,fonoaudióloga, nutricionista endocrinologista)e mais um especialista em psicologia da familia para fechar o diagnóstico antes de prescrever qualquer medicação.Mas no Brasil e em especial no estado de Pernambuco não existe nenhum serviço com esta assistência, apenas CAPS que não realiza neunhum tipo de exame mas medica e realiza atendimento grupal sem respeitar a individualidade de cada um ou seja é um pacote. Com terapeuta ocupacional e especialista em Psicologia da Família e Realidade Social não tenho com encaminhar as crianças. Tenho 19 anos experiencia

  2. Eu procuro trabalhar com os profissionais da Educação, vou às escola, atendo família para descobrir se a família funciona com sintoma que afeta significamente o desempenho escolar e o aluno não precisa tomar remédio. Mas, uma mudança na dinânica familiar. Atualmente coordeno um grupo de estudo mensalmente com professores de escola Pública e o com trabalho já obtemos bons resultado. Os governos estaduais e muncipais não cumprem suas responsabilidade diante da siutação: Alunos com Dificuldade de Aprendizagem e as comorbidades tardias e recorrentes estão ocorrendo, entre elas a Dependência Química. Os CAPS só deveria admitir criança, adolescente e adulto com o diagnóstico completo.

  3. Meu filho era muito nervoso e hiperativo. Quando tinha 3 aninhos fizemos todos os exames nele e não tinha nada, mas o médico mandou dar tarja preta à ele, segui minha intuição e não dei. Procurei ajuda psicologica, ele fez vários anos de terapia. Hoje formado em engenharia da computação, passou sendo laureado na Universidade. É um rapaz tranquilo, carinhoso, e penso que o problema dele era só inteligencia. Coisa de meninos de hoje em dia. Normais…

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