Por João Ortega
da Agência USP de Notícias
Valores reproduzidos constantemente na imprensa sobre professores, principalmente da rede pública de ensino, denigrem a imagem desses profissionais. Ao criticar a educação do Brasil, os veículos de comunicação não levam a discussão para as razões do ensino ter se tornado tão precário. Ao invés disso, criticam a atuação dos responsáveis pelo ensino, apontando para sua substituição por profissionais melhores, e não pela melhor formação dos que já estão lá. Esse fenômeno foi percebido por pesquisa da Faculdade de Educação (FE) da USP em revisão de diversas notícias sobre o assunto.
A jornalista Katia Zanvettor Ferreira, autora do estudo /Quando o professor é notícia? Imagens de professor e imagens do jornalismo/, analisou notícias de diversos jornais impressos do estado de São Paulo entre 2007 e 2011 e percebeu que estes veículos**tendem a dar fórmulas para resolver o problema da educação. Dessa forma, tratam a questão de maneira simplória e evitam reflexão e confronto de opiniões. “É a saída reacionária da própria imprensa que direciona o debate da sociedade”, explica. “Minimiza o jogo democrático”.
Katia ressalta que paira sobre os textos dos grandes jornais uma identificação imaginária na temática do professor, ou seja, quem escreve toma o que em seu imaginário é uma verdade como sendo uma “verdade absoluta”. Assim, a tendência é que os textos procurem confirmar aquilo que os escritores acreditam e consideram verdade, sem abertura para posições divergentes. Aparecem nas matérias, dessa forma, uma repetição dos mesmos discursos.
*Técnicas* Existem algumas formas de fazer jornalismo que se repetiram nos textos analisados no estudo, e contribuem para a visão prejudicial do professor. A utilização do especialista sobre educação como fonte absoluta é uma delas. A prática de um jornalismo investigativo, com entrevistas em profundidade, levantamento de dados e pesquisas buscando discutir as questões tratadas no texto são práticas cada vez mais raras na grande imprensa. Os jornalistas fazem perguntas superficiais apenas para confirmar aquilo que pressupõem e buscam conseguir falas de entendidos do assunto que justifiquem o seu próprio discurso.
Ainda em relação a entrevistas, nos textos utilizados pela pesquisa, não foi encontrado um princípio básico do jornalismo: buscar todos os lados da notícia. Os veículos de comunicação só apresentam o lado que concorda com a visão prejudicial do professor, sem falar com este ou com outro especialista que o vê de uma forma diferente.
Bandeiras históricas de movimentos sociais são utilizadas para comprovar a tese do veículo. Por exemplo, é quase um consenso entre o povo brasileiro que os salários de professores devem ser aumentados. Entretanto, os jornalistas colocam esse argumento em seus textos de forma excludente: os professores que trabalham hoje nas instituições públicas seriam mal preparados e, portanto, deveriam ser substituídos. Os substitutos, por serem mais competentes, deveriam ser melhor remunerados. Assim, no discurso jornalístico o movimento é de exclusão daqueles que estão no cargo agora, o que cria o reforço de um estereótipo do professor ruim.
O preconceito, segundo Katia, também faz parte das matérias jornalísticas que deturpam a imagem do professor. Ele, entretanto, disfarça-se num raciocínio que aparenta ser lógico. “Dizem que os professores vêm de classes populares e, portanto, são despreparados”. Não são apontados os problemas da preparação, apenas relacionam a incompetência com a origem social.
*Pesquisa* A ideia para o estudo formou-se enquanto a jornalista analisava programas de utilizações de jornais no ensino em escolas. Durante esse trabalho, ela revisou diversos jornais, e acabou lendo muitas notícias relacionadas à educação. Então, percebeu nelas a presença dessa visão prejudicial sobre os professores. Não havia grande preocupação com a cobertura da educação e pouco interesse em assuntos particularmente importantes sobre situação dos profissionais do ensino, como greves. A pesquisa é a tese de doutorado da autora, na linha de pesquisa Linguagem e Educação da FE, e foi orientada pelo professor Aleksandar Jovanovic.
Fonte: Agência USP de Notícias