Antes de qualquer coisa devo dizer que a liberdade de expressão é um direito. Em resposta eu e muitos outros escrevemos. Mas é preciso que os meios de comunicação atentem para o que publicam, porque a falta de responsabilidade pode causar sérios danos…
Sobre a reportagem publicada na VEJA, segue abaixo o meu rascunho, escrito na 2a feira.
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Em artigo publicado na revista Veja, a escritora Lya Luft utiliza de sua liberdade de expressão para refletir sobre o direito ao acesso e permanência na educação para as pessoas com deficiência, fazendo parecer inclusive que o direito vem sendo exercido apenas por ser politicamente correto.
Nesse ponto talvez não esteja de todo enganada, pois educação é direito central e fundamental para o exercício dos demais direitos, inclusive dos direitos políticos. É direito que não se pode dispor e, de acordo com a Constituição Federal, é dever do Estado, da família e da sociedade, porque não é correto deixar crianças e adolescentes fora da escola, e tanto o
Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei 7853/89 – artigo 8o quanto a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência têm o mesmo entendimento, sendo possível afirmar que, além de crime é mesmo politicamente incorreto o não exercício do direito ou a sua obstaculização.
À parte disso, são muitos os dados que evidenciam os benefícios da educação inclusiva para pessoas com e sem deficiência e são muitas as políticas públicas implementadas com sucesso para garantir exercício do direito, mas a reflexão agora é sobre a liberdade de expressão, que fere o direito do outro, principalmente quando se trata de criança e adolescente. É sobre a utilização de meios de comunicação para expor opiniões que levam à exclusão social e ao aumento do preconceito e da discriminação, inclusive de classe.
Não se trata de politicamente correto ou de batalhas maniqueístas, falamos de pessoas, com todas as suas particularidades; falo de gente, seres humanos que podem ser prejudicados por reflexões inconsequentes.
E de fato estamos em período de matrícula nas escolas e muitas famílias já receberam um “não” direto ou indireto para o ingresso de seus filhos com deficiência em escolas das cinco regiões do Brasil, e é com muita dor que lidam com o fato; é com a dor de quem sofre discriminação e preconceito,
Dor que muitas vezes passa a pautar a própria vida. A escritora Lya Luft precisa saber que dói, e que as políticas públicas são de direito, porque é esse o paradigma e, principalmente, porque foram conquistadas por pessoas que sofreram a dor do preconceito e discriminação; seja a política de cotas raciais ou as políticas públicas de inclusão educacional, elas nada mais são do que obrigação do poder público para com aqueles historicamente discriminados.
Esperamos que os diretores de escolas públicas e privadas não levem a serio as reflexões da colunista e que tenham a certeza de que negar ou fazer cessar matrícula por motivo de deficiência é crime, está na Lei 7853/89 – artigo 8o, mas espero também que a escritora reflita sobre os seus conceitos e o seu direito de expô-los, quando isso pode afetar diretamente a vida de milhões de pessoas.
É preciso saber que o Brasil tem 45.000.000 de pessoas com deficiência e pessoas com deficiência não são pessoas com doença mental, muito embora a discriminação continuada e a exclusão de cada dia possa levar a isso. Não sei o que a escritora entende por demência, mas o fato é que a grande maioria dos crimes não são cometidos por “dementes”, outro engano da colunista, que faz parecer que cada um no seu quadrado resolveria o “problema” na escola e em toda a sociedade.
Lógico que as pessoas precisam do atendimento adequado da saúde, educação, assistência e de todos os setores, mesmo porque direitos humanos são inegociáveis. Aproveito para informar que o Plano Nacional dos Diretos das Pessoas com Deficiência Viver Sem Limite é outra conquista que envolve 15 ministérios, porque de verdade estamos avançando, e podemos avançar mais se o conservadorismo deixar de lado a sua intolerância e inconformismo com a
ascensão social de milhões de brasileiros, entre eles pessoas com deficiência e, ainda, como no meu entendimento, o conservadorismo que pretende deixar pessoas com deficiência em um quadrado é o mesmo que não demonstra
indignação diante das atrocidades ditas e cometidas contra homossexuais,
Devemos sim, unir forças para combater essa onda que há muito já deveria ter passado.
E sim, mais que possível, a inclusão educacional é uma conquista, uma realidade e principalmente um direito que não pode ser violado. À parte disso, reafirmo que os números evidenciam avanços que eu mesma inúmeras vezes presenciei em redes públicas e escolas que acreditaram e mudaram o paradigma, garantindo o acesso e permanência com todos os recursos
necessários para todas as crianças e adolescentes com deficiência. Mas quem tem vontade política faz e quem não tem diz que não é possível a matrícula em classe comum, mas esse ja é um outro assunto…
A liberdade de se equiparar o direito à educação ao politicamente correto gera revoltas legítimas e é preciso que as famílias transformem a sua indignação em ação, e que continuem fazendo acontecer cada vez mais. A promoção da manutenção da invisibilidade social , do preconceito e da discriminação está sempre a serviço de interesses, mesmo que pessoais, mas
é preciso que os meios de comunicação pensem em suas consequências e que, no mínimo, abram espaço para o contraponto.
Estamos falando sobre seres humanos, Pessoas que compõe a diversidade humana e que integram o imenso “quebra-cabeça” da humanidade. Não se trata de politicamente correto: Pessoas com deficiência existem, são gente! Pessoas
com deficiência têm direitos humanos!
Pais, mães, professores e gestores : não deixem de lutar pelos direitos dos seus filhos e alunos e não se deixem influenciar por posicionamentos pautados pelo preconceito.
Claudia Grabois – Advogada, Coordenadora do Fórum Nacional de Educação Inclusiva e da Rede Inclusiva Direitos Humanos Brasil, Membro do CONADE-SDH, da Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ e do Inclusão Já – Em defesa do direito à educação. Diretora de inclusão social da FIERJ. Ex-diretora de educação especial do Município do Rio de Janeiro, , ex-Presidente da Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down.
http://inclusaoja.com.br
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parabens……como mae fico feliz pelo que vc escreveu ,midia precisa esclareçer, sobre as crianças especiais que elas tem sentimentos sao pessoas ,e tem familias.
Que façamos ecoar as palavras da Claudia Grabois, não podemos nos debruçar sobre ideias equivocadas ou preconceituosas que desconsideram os direitos das pessoas enquanto sujeitos detentores destes, independente de suas condições sociais, raciais, deficientes ou não, com diferentes opções religiosas, políticas, opção sexual, gênero, etc. O direito de ser humano, é o que prevalece em primeiro plano.