A luta por mobilidade com acessibilidade continua

Um globo com pictogramas representando as diferentes deficiências

Por Izabel Maior *

Setembro foi o mês escolhido pelas pessoas com deficiência para celebrar suas conquistas, em cerca de trinta e três anos do movimento. Em termos históricos, é um processo curto e recente. Na vida de cada pessoa é um período longo e, muitas vezes, vem associado ao desapontamento com os resultados alcançados.  Por essa razão, 21 de setembro  (Lei nº 11.133/2005) evoca a luta desse segmento por cidadania e aponta para as novas bandeiras, bem como insiste em pautas de reivindicação que não podem ser abandonadas pelos ativistas da atual geração. A razão de tudo é interromper a invisibilidade e promover inclusão social, passo a passo, pois as lutas sociais não terminam, elas se reinventam em um novo patamar de expectativa.

A sociedade vem evoluindo, mas não se pode dizer que a discriminação contra as pessoas com deficiência foi superada. A luta por direitos se mantem na agenda do movimento e um dos pontos mais importantes é acessibilidade, base para a realização individual e o convívio na sociedade.

Acessibilidade se refere à condição de utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida.  É o que consta na legislação federal específica para o tema (Leis 10.098 e 10.048/2000 e Decreto 5.296/2004). É construir formas de participação de todos a partir da inclusão de surdos, cegos, pessoas com deficiência intelectual, cadeirantes e idosos entre outros.

O decreto e as normas técnicas da ABNT esclarecem que mobiliário urbano é o conjunto de objetos existentes nas vias e espaços públicos (calçadas acessíveis são indispensáveis), tais como semáforos, postes de sinalização e similares, telefones e cabines telefônicas, fontes públicas, lixeiras, toldos, marquises, quiosques e quaisquer outros de natureza análoga. A questão aponta para uma reorganização do espaço público atualmente desagradável à circulação das pessoas em geral.

Uma conquista recente foi a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada pela ONU em 2006 e ratificada como emenda constitucional, processo concluído com o Decreto nº 6.949 de 2009. A Convenção mudou radicalmente o entendimento de deficiência, tratando-a como uma condição externa à pessoa e dependente do ambiente no qual ela está inserida. Dessa forma, o combate à discriminação (atitude) e a obrigação de existir acessibilidade (participação) são aspectos essenciais da Convenção.

Nos últimos meses, as ruas foram palco de manifestações populares democráticas (vandalismo não!) que apontaram para a mobilidade urbana inadequada e as consequências negativas na vida dos brasileiros.

Em várias cidades as pessoas com deficiência saíram de casa para se manifestar a favor da acessibilidade.

As reivindicações se apoiam na política de mobilidade urbana ( Lei 12.587/2012) que objetiva a integração entre os diferentes modais de transporte (ônibus, metrô, trens e barcas) e melhoria da acessibilidade e mobilidade das pessoas e cargas nos municípios.

Ainda pouco conhecida como política pública, a infraestrutura de mobilidade urbana compreende vias, estacionamentos, terminais e estações, pontos de embarque e desembarque e sinalização das vias e do trânsito.

Calçadas acessíveis com condições de segurança e conforto, sem buracos ou outros obstáculos é central para todos. Além disso, os usuários têm direito à informação nos pontos de embarque e desembarque de passageiros, de forma gratuita e acessível, sobre itinerários, horários, tarifas dos serviços, além da interação com outros tipos de transportes. Esse é um direito novo da legislação.

O governo municipal é o responsável pela maior parte das medidas de acessibilidade que afeta a vida do povo, sem eximir os gestores estaduais e federais de suas obrigações. A sociedade também responde pela construção e manutenção dos bens e serviços públicos e privados de uso público, segundo as regras de acessibilidade nos espaços e serviços que oferece. As prefeituras têm responsabilidade quanto à acessibilidade e fica sujeita à fiscalização do cumprimento dessas obrigações. Da mesma forma, devem ser aplicadas sanções administrativas, cíveis e penais previstas em lei, quando não forem observadas as normas de acessibilidade. Trata-se de planejar e executar as medidas de acessibilidade por inteiro e não apenas disponibilizar algumas obras e oferta de equipamentos de acessibilidade como se fosse por benemerência.

Cada intervenção urbana envolve financiamento público devidamente custeado com os impostos, taxas e outras contribuições públicas que somos obrigados a pagar. Portanto, a acessibilidade está na conta da população e como tal é devida a essa mesma coletividade de contribuintes. Soma-se a esse direito, a noção de que acessibilidade não é algo complementar, mas sim uma das realizações essenciais para promover qualidade de vida para todos. Acessibilidade caracteriza-se como um investimento público antecipado com dinheiro dos contribuintes em nome de todas as pessoas que moram no município ou transitam por ele.

A comemoração do dia 21 de setembro é um excelente momento para defender mobilidade urbana com acessibilidade. Vale informar que os municípios têm a obrigação de elaborar os planos de mobilidade urbana no máximo até 2015. É uma nova oportunidade de garantir calçadas, demais espaços públicos e transportes acessíveis para toda a população.

Feliz mês de luta!

* Izabel Maior é docente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Foi secretária nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Secretaria de Direitos Humanos. Em sua gestão foi elaborado o decreto da acessibilidade e ratificada a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU.

One Comment

  1. Izabel

    Parabéns pelo excelente texto!

    A luta continua, se reinventando para acompanhar os novos tempos, as demandas e as expectativas, pois os direitos alcançados impulsionam a querer mais, amparados na legislação, especialmente na Convenção.

    abraços

    Marta

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *