Por Andrei Bastos
Eu costumo resumir a história da humanidade com deficiência em quatro etapas bem distintas. A primeira, no começo dos tempos, quando éramos caçadores nômades, reservava para os seres humanos com deficiência nada mais do que o abandono no caminho, para morrer, já que não lhes era possível acompanhar suas tribos pelas florestas, campos e montanhas.
A segunda, quando os seres humanos desenvolveram a agricultura, e ficaram mais humanos, abrigaram os velhos, os doentes e os deficientes nas cabanas e nos povoados que se formaram e se transformaram nas cidades que, por sua vez, protegeram a todos da natureza selvagem e da selvageria de outros seres humanos.
A terceira, que se anunciou como a grande mola do progresso no planeta, exercendo o seu domínio sobre a natureza, transformando-a em ferramentas e instrumentos diversos para a vida confortável dos cidadãos, roubou a cidadania de quem não tinha condições de apertar os parafusos dos tempos modernos — as pessoas com deficiência.
A quarta, saudada como a mais bem-vinda por todas as pessoas, com ou sem deficiência, veio concretizar os sonhos revelados nas histórias de ficção científica, oferecendo a possibilidade de superação de quase todas as limitações por meio das suas sofisticadas ferramentas científicas e tecnológicas, inclusive proporcionando qualidade de vida superior para os velhos, os doentes e as pessoas com deficiência.
Vivendo esta última etapa, parecia que tínhamos chegado ao paraíso em nosso próprio mundo, com a quase impossibilidade de acompanharmos as sucessivas descobertas e conquistas da ciência e da tecnologia. O pensamento humano não ficou para trás e avançou à frente da ficção científica, emancipando negros, mulheres e minorias excluídas.
O movimento de emancipação das pessoas com deficiência chegou mesmo a ser reconhecido como equivalente ao dos negros e ao das mulheres, sendo definido como “a última grande luta” pelo jornalista americano Don Aucoin, em artigo publicado no jornal “The Boston Globe”, em 27 de fevereiro de 2008.
Não há bem que sempre dure, infelizmente, e o Brasil, que se orgulhava da sua legislação defensora dos direitos das pessoas com deficiência — considerada uma das melhores das Américas, com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU promulgada com equivalência de emenda constitucional —, assiste agora ao triste espetáculo de ações de retrocesso realizadas com desenvoltura na votação do Plano Nacional de Educação (PNE). Separar as crianças com deficiências das demais é um atraso.
As ações de tais agentes do retrocesso mascaram-se de defensoras dos direitos humanos, e até ganham prêmios oficiais, mas na verdade estão servindo à fidelização eleitoral de bolsões mantidos na ignorância, com seus autores recusando a oportunidade de contribuir para ampliar exponencialmente a verdadeira inclusão somando esforços e capacidades às escolas de ensino regular.
Mas como também “não há mal que nunca se acabe”, as pessoas com deficiência brasileiras saberão lutar para dar dois passos à frente para cada passo dado para trás. Educação inclusiva já!
Fonte: http://oglobo.globo.com/opiniao/juntos-misturados-na-sala-de-aula-11144951#ixzz2oP9lwoDO
Alguém sabe a origem dessa imagem? Gostaria de utilizá-la em um publicação, portanto, quero dar os créditos.