Por Izabel Maior *
O simbólico dia oito de março, reconhecido pela ONU como Dia Internacional da Mulher em 1975, reforça a agenda dos direitos de igualdade de gênero, e a necessidade da presença e visibilidade do tema na pauta de reivindicações dos diversos segmentos da sociedade.
Arrisco afirmar que o movimento de mulheres negras percebe e atua mais fortemente pelo fortalecimento e igualdade de participação e liderança política, independência econômica e medidas de enfrentamento à violência que outros segmentos sociais, entre os quais se encontram as mulheres com deficiência.
É inegável a existência de avanços na presença das mulheres com deficiência no cenário público, quer na gestão das políticas de inclusão (primeira pessoa com deficiência na CORDE e SNPD/SDH, 2002 a 2010) e no âmbito legislativo, onde sobressaem-se na história recente da Câmara Federal, Rosinha da Adefal e Mara Gabrilli.
Por outro lado, é quase desconhecida a inserção da mulher com deficiência em cargos de comando do Executivo (prefeitas e governadoras), no Judiciário e no Ministério Público, apesar de o número de mulheres em geral ter crescido nesses nichos.
Comparativamente com a mulher sem deficiência, aquelas com deficiência, segundo estatísticas do IBGE, deparam-se com a maior barreira à participação no mercado de trabalho e também com a maior diferença salarial entre gêneros. As mulheres com deficiência recebem os menores valores para igual atividade entre todos os segmentos.
Essa situação faz lembrar a luta inicial das mulheres operárias no final do século XIX e início do seguinte, por condições de trabalho, redução da jornada e salários decentes nas fábricas, além do direito ao voto.
Recentemente, os disque-denúncias estão apurando as formas de violência contra as pessoas com deficiência e, conforme o suposto, as mulheres predominam entre as vítimas de negligência, abandono econômico, maus-tratos e abusos psicológicos, físicos e sexuais. O quantitativo aumenta com a maior divulgação desse perfil e estímulo à reação da sociedade contra a violência existente. Em resposta a essa situação gravíssima, surgiu o Programa de Prevenção e Combate à Violência, no âmbito do governo estadual de São Paulo, iniciativa pioneira de 2013, do qual fui consultora.
Apesar de a reformulação do CONADE em 2005 ter aberto uma cadeira governamental para a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, a aproximação dos segmentos e a agenda pública não se viabilizaram.
Por articulação e esforço de lideranças femininas com deficiência, organizaram-se palestras e seminários para enfatizar a vulnerabilidade das mulheres e meninas com deficiência e o consequente recorte de gênero presente na Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, marco constitucional no Brasil desde 2009.
Em 2012, na Reatech-SP e na Reacess-RJ, participei diretamente do debate sobre políticas públicas para as mulheres com deficiência. A mobilização ganhou fôlego para demandar a ação do governo federal.
Assim, foi realizado em 2013 o I Seminário Nacional, enfocando as políticas públicas, o enfretamento da violência e o protagonismo da mulher com deficiência. O encontro produziu uma carta com propostas para o fortalecimento e a efetivação dos direitos das mulheres com deficiência.
No documento foram tratados, entre outros, os direitos da mulher com deficiência à saúde e os direitos sexuais e reprodutivos, a capacitação das equipes, a divulgação das diretrizes de atendimento e a necessidade de adaptação de equipamentos e procedimentos.
Apesar desses avanços, nos conselhos de direitos, nas instituições e nos eventos por segmentos, ainda é incipiente a agenda da igualdade de gênero entre as pessoas com deficiência. É um desafio importante.
O ciclo conferencial em 2015 discutiu a transversalidade como modelo de gestão para as políticas voltadas aos direitos humanos de todos os segmentos sociais. Desse modo, diretrizes e ações estratégicas visando à mulher com deficiência comporão as propostas da IV Conferência Nacional dos Diretos da Pessoa com Deficiência e da 12ª Conferência Nacional dos Direitos Humanos, em abril deste ano, quando se espera que as delegadas com e sem deficiência sejam ouvidas.
As propostas estarão associadas às deliberações da consulta nacional às mulheres com deficiência (e ciganas), concluída em 3 de março, salientando a acessibilidade e o enfrentamento do preconceito. Nesseencontro foram eleitas delegadas para a 4ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, em maio de 2016. Ampliou-se, portanto, a oportunidade de a participação social inserir a pauta das mulheres com deficiência nas decisões que vierem a ser tomadas.
Deseja-se que o tema escolhido pela ONU para 8 de março de 2016, “Por um planeta 50 a 50 em 2030: um passo decisivo pela igualdade de gênero”, oriundo dos compromissos para o Desenvolvimento Sustentável, inspire delegadas e delegados das conferências e, acima de tudo, todas as pessoas a cada dia do ano.
___________________
* Izabel Maior é fisiatra, mulher com deficiência, conselheira do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência – COMDEF e do Conselho Estadual da Política de Integração da Pessoa com Deficiência – CEPDE, ambos do Rio de Janeiro, como representante do SóLazer. Ex-secretária nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência – SNPD/SDH.