Por Keliny Silva
Entre estereótipos e empoderamento: a representação da deficiência na publicidade brasileira contemporânea, por Keliny Silva É saber histórico, e execrável, a intrínseca relação entre a deficiência e o preconceito, relação que perdura por séculos e correlaciona a imagem do deficiente aos estigmas de inferioridade, de incapacidade e de improdutividade.
Tais características limitantes tendem a produzir representações estereotipadas e são essas, em sua grande maioria, que se fazem presente no imaginário social. Sendo assim, refletir sobre o indivíduo com deficiência na publicidade – narrativa que costumeiramente empenha-se em construir e/ou reproduzir representações – é desafiador, tendo em vista o silenciamento que esses corpos vivenciam no âmbito social e, consequentemente, no midiático. Especificamente ao meio publicitário, é válido investigar o modo como a deficiência tem sido apresentada, pois é legítima a relevância da publicidade na construção de sentidos e significados existentes na sociedade contemporânea, principalmente nas de consumo.
Os produtos publicitários tendem a estabelecer, de certo modo, controle ideológico e imagético ao expressar suas preferências quanto aos discursos e corpos que os compõem. Seguindo logicamente essa argumentação, podemos visualizar o poder influenciador do discurso publicitário para reforçar estigmas e estereótipos relacionados aos sujeitos com deficiência tanto quanto para desmistificalos. Ao direcionarmos o olhar para a prática publicitária, ou seja, para aqueles que detêm o conhecimento específico de produção de anúncios, filmes e afins nos deparamos com o despreparo em dissertar sobre a temática da deficiência, bem como com a ausência de interesse na causa, razões contributivas para produções publicitárias que tampouco englobem a questão da representatividade – basilar à causa com deficiência. Desse modo, apesar da evolução da publicidade no que diz respeito aos discursos da diferença abrigados em seu fazer, o lugar de fala do indivíduo com deficiência ainda nos traz, em sua maioria, representações que publicizam e estimulam estereótipos com teor desfavorável.
Em estudo recente 1 , foi observado que a representação do corpo com deficiência na publicidade oscila conforme o dizível midiático, isto é, de acordo com o objetivo 1 SILVA, Keliny Cláudia da. A discursivização do ethos do indivíduo com deficiência nas narrativas publicitárias brasileiras contemporâneas. Recife, 2017. 140f. Dissertação de Mestrado defendida no Programa Pós-Graduação em Comunicação na UFPE-PE. No prelo. comunicacional que o anunciante almeja alcançar. Assim, poderemos visualizar corpos ativos e autônomos – desmistificando a deficiência, ao mesmo tempo em que nos depararemos com corpos com deficiência carentes e passíveis de dependência, estimulando o preconceito.
Dentre as representações encontradas, algumas categorizações foram propostas: 1) deficiência como passível de pena, 2) deficiência como incentivadora para atos heroicos, 3) deficiência como estratégia de choque e 4) deficiência não foi limitante. As três primeiras categorias nos mostram a deficiência como algo que determina e inferioriza o sujeito, intensificando a dificuldade da pessoa com deficiência na construção de sua própria identidade. E apenas a última nos convida a visualizar o indivíduo com deficiência independente e investido de poder, nessa categoria a ênfase é dada ao indivíduo em si e não à deficiência. É perceptível, portanto, que o estigma perpassa, de forma persistente, as representações do corpo com deficiência nas produções publicitárias. E, neste sentido, há uma problemática, pois há uma propagação de sentidos e significados que não condizem com a realidade vivenciada pelos próprios deficientes.
Diante dessas considerações, é incontestável a necessidade de olhar de forma mais humanizada e com mais responsabilidade para a questão da deficiência. A publicidade contemporânea já aponta para alguns vestígios de mudança, haja vista a naturalidade que a Johnson’s Brasil apresentou um bebê com Síndrome de Down para celebrar o Dia das Mães no primeiro semestre de 2017. Publicidades como esta são bem-vindas, bem como aquelas que trazem a acessibilidade em sua construção. A discussão é vasta e, por isso, torna-se necessário continuarmos observando publicidades que abordam a deficiência em suas narrativas.
1 SILVA, Keliny Cláudia da. A discursivização do ethos do indivíduo com deficiência nas narrativas publicitárias brasileiras contemporâneas. Recife, 2017. 140f. Dissertação de Mestrado defendida no Programa Pós-Graduação em Comunicação na UFPE-PE. No prelo
Keliny Silva – Mestre em comunicação pela UFPE
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