Jesus Flores Beledo *
Traduzido do espanhol para a Inclusive por Lucio Carvalho, em 11/01/2010.
Não é de agora que as organizações que trabalham a favor das pessoas com síndrome de Down perceberam a necessidade de sensibilizar a opinião pública. No princípio a idéia era simplesmente arrecadar fundos para desenvolver serviços educativos, assistenciais ou de reabilitação que o Estado deixava de oferecer. Rapidamente, porém, as organizações perceberam outra dimensão muito mais abrangente e transcendental: o papel da publicidade e dos meios de comunicação na imagem que a sociedade cria de si própria e, por consequencia, sua enorme influência na promoção (ou o contrário dela) da aplicação prática e efetiva dos princípios de integração, normalização e inclusão. Isto significa falar em mudança de atitudes, preconceitos e estereótipos sociais como instrumento para a melhora da qualidade de vida das pessoas com deficiência.
Como observou Antón Álvarez, “em nosso país (Espanha, n. do trad.), em pouco mais de duas décadas, o uso de técnicas publicitárias possibilitou que a opinião pública tenha tomado conhecimento e passado a compartilhar a problemática das pessoas com deficiência em um ritmo tão rápido e com um nível de universalidade que dificilmente nenhuma outra ação de outra ordem poderia conseguir” (1). Em um mundo onde a realidade se reconstroi através dos meios de comunicação, o que não está representado neles não existe, de fato, para a população em geral. Outra questão, que continua essa discussão, diz respeito ao modo como são representadas as pessoas com deficiência nas poucas vezes em que merecem a atenção dos meios de comunicação e a importância de que sejam representadas em um contexto positivo. Estes dois efeitos, o denotativo gerado pela simples aparição pública nos meios e o conotativo, marcado pela forma como são representadas, em que contextos e em quais papéis, Álvarez soma um terceiro: o denominado “prioridade na ordem do dia”.
Por último, destaca o autor como os meios de comunicação atuais oferecem uma visão fragmentada da realidade, porque evidenciam sobretudo os efeitos impactantes – em grande medida buscariam mas a estimulação sensorial (ou sentimental, n. do trad.) que a transmissão de conteúdos – porém evitam uma compreensão mais aprofundada dos problemas sociais. As questões sociais parecem “emergir” e “desaparecer” dos meios de forma um tanto compulsiva porém, apesar de sua importância e do interesse que geram nos momentos de maior emergência e evidência, deixam uma certa sensação de distância e superficialidade, impedindo que o expectador penetre em seu conteúdo e se identifique com elas.
Como se sabe, no que diz respeito às questões sociais, muitas vezes é extremamente trabalhoso mudar uma tendência, obter um ponto de inflexão no interesse público para que um setor majoritário da sociedade compreenda e passe a apoiar as reivindicações das pessoas com deficiência. Entretanto, além de promover a mudança de atitudes – que não deixa de ser um primeiro passo, necessário mesmo que não seja suficiente – é hora de aplicar na realidade cotidiana mudanças tangíveis que permitam a integração de fato. Neste sentido, consideramos que é uma prioridade no momento atual conseguir que a temática das pessoas com síndrome de Down e da deficiência estejam presentes exatamente onde se gera pensamento e bens culturais: as páginas de opinião dos jornais, os ensaios de bioética, filosofia e antropologia, os livros sobre política, as músicas da moda… Porém é muito importante que isso seja feito não por pessoas que tenham relação direta com o âmbito da deficiência mas que irão fazê-lo induzidas por nossas entidades e organizações, pessoas que não têm nada a ver com deficiência e que, através de seu olhar, irão provocar essa reflexão acerca de seu significado, sobre a integração, inclusão e normalização, sobre uma sociedade que quer ser plural, democrático e civilizado na realidade e que, por isso mesmo, acolhe em seu seio com total naturalidade e em condições de igualdade as pessoas com síndrome de Down e outras deficiências. Seremos capazes de motivar, mobilizar e acompanhar os “agentes” culturais para que se envolvam nesse apaixonante e revolucionário projeto social?
Um feliz ano de 2010.
* Doctor en Medicina y Cirugía, Doctor en Farmacología. Catedrático de Farmacología. Director del Down 21.
(1) ALVAREZ RUIZ, A., “Persuadir para integrar. El papel de la publicidad en la integración social de las personas con discapacidad”, en Juan Antonio LEDESMA (ed.), La imagen social de las personas con discapacidad (CERMI, Madrid 2008), p. 89.