Santiago, 16/01/2009 – “A América Latina não está nas condições trágicas dos países menos desenvolvidos, mas uma taxa média de 130 mortes para cada cem mil nascidos vivos é muito alta”, disse à IPS Egidio Crotti, representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Crotti apresentou ontem em Santiago, junto com a ministra do Planejamento do Chile, Paula Quintana, e a subsecretária de Saúde Pública, o informe anual do Unicef intitulado “Estado Mundial da Infância 2009”, dedicado à saúde materna e neonatal. O lançamento mundial foi em Johanesburgo, África do Sul.
A cada dia morrem no mundo 1.500 mulheres por complicações na gravidez e no parto, isto é, mais de 500 mil por ano. O risco de morte por este motivo é 300 vezes maior entre as mulheres que vivem em nações menos adiantadas do que as que moram em países industrializados, diz o documento. Além disso, estima-se que para cada mulher que morre outras 20 sofrem doenças e incapacidades relacionadas à gestação e ao nascimento de seus filhos. Enquanto na África subsaariana a taxa de mortalidade materna é de 920 em cem mil nascidos vivos, nos países industrializados cai para oito.
O Chile é o melhor colocado da América Latina, com 16 mortes maternas por cem mil, seguido do Uruguai 20, Costa Rica 30, Cuba 45 e Venezuela 57. Na metade da tabela estão México com 60, Argentina 77, Brasil 110, Colômbia e Panamá 130, República Dominicana e Paraguai 150 e El Salvador e Nicarágua 170. Fecham a lista Equador com 210, Peru 240, Honduras 280, Guatemala e Bolívia 290 e Haiti 670. “Isto é ainda mais grave porque na América Latina há recursos. Tudo depende de onde os países colocam suas prioridades”, disse Crotti.
Quanto à mortalidade neonatal (bebês que morrem antes dos 28 dias após o nascimento), a América Latina e o Caribe apresentam uma taxa média de 13 mortes em mil nascidos vivos. Enquanto nos países industrializados são três por mil, na África ocidental e central 45 e na Ásia meridional 41. Na América Latina se destaca cuba, com mortalidade neonatal de quatro em mil nascidos vivos, seguida do Chile com cinco, Uruguai sete, Costa Rica oito e Argentina 10. Os mais atrasados nesse aspecto são Guatemala com 19, Bolívia 24 e Haiti com 32.
Crotti destacou que 80% das mortes neonatais no mundo são evitáveis. Sobre a mortalidade de crianças menores de cinco anos, a região ostenta média de 26 em cada mil nascidos vivos, quando a média mundial é de 68 mortes. Para o representante do Unicef, existe consenso científico sobre os fatores que permitiriam erradicar a mortalidade materno-infantil. Destaca-se a criação de um contexto favorável para o desenvolvimento da mulher e o cumprimento de seus direitos, um cuidado com a saúde oportuno e contínuo para a mãe e seu filho e implementação de políticas públicas integrais e coordenadas.
“Outro tema que considero um grande desafio para a América Latina e o Caribe em seu conjunto é a gravidez de adolescentes, porque não diminuiu e a ciência nos mostra que é muito perigoso para a saúde das mulheres e implica abandono da educação. Além disso, se relaciona com sociedades muito violentas contra a mulher”, disse Crotti. “Se a América Latina quer cumprir a meta do milênio sobre mortalidade materna e infantil tem de acelerar suas taxas de redução, porque, no ritmo atual, a maioria dos países estará muito longe de conseguir este compromisso até 2015”, disse Crotti, que lembrou os governos de que se trata de vidas humanas.
Entre 1990 e 2005, a taxa de mortalidade materna caiu de 180 casos em cem mil nascidos vivos para 130. Em 2000, os governos acordaram na Organização das Nações Unidas oito grandes Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) a serem cumpridos até 2015, tomando como referência os indicadores de 1990. O quarto objetivo é sobre redução em dois terços das mortes infantis entre 1990 e 2015 e o quinto exorta a reduzir em três quartos a mortalidade materna e conseguir acesso universal à saúde reprodutiva. Os demais ODM se referem à redução da pobreza extrema, à fome, educação, igualdade de gênero e autonomia da mulher, combate a doenças como Aids, proteção do meio ambiente e promoção de uma associação mundial para o desenvolvimento.
Crotti destacou especialmente o Sistema de Proteção à Infância chamado “Chile Cresce Contigo”, inédito na América Latina, implementado pelo governo da socialista Michelle Bachelet. Este programa multisetorial tem com propósito acompanhar a mãe e o filho desde a gestação até os 4 anos de idade, o que implica apoio bio-psico-social nos centros de saúde, berçários e jardim de infância com recursos didáticos para estimulação precoce, detecção oportuna e tratamento de problemas, entre outros benefícios.
Em 2007 o programa começou a operar em 159 localidades e em 2008 foi ampliado para todo o país. “Estamos falando de 198 mil mulheres grávidas atendidas no sistema público de saúde e de 647 mil crianças desde o nascimento até os 4 anos”, disse a ministra Paula Quintana. Há duas semanas, o governo enviou ao parlamento um projeto que cria um Sistema Inter-setorial de Proteção Social e que institucionaliza o Chile Cresce Contigo. O Poder Executivo espera que o plano seja aprovado neste primeiro trimestre. O governo de Bachelet já manteve contatos com outros países da região, como Brasil, México e Uruguai, para tentar replicar esta experiência fora do Chile, disse Quintana. (IPS/Envolverde)
Fonte: Envolverde/IPS