Interação entre pares na educação infantil: exclusão-inclusão de crianças com deficiência intelectual, por Erenice Natalia Soares de Carvalho.
RESUMO/ABSTRACT
Segundo a abordagem sociocultural construtivista do desenvolvimento humano o sujeito constitui-se mediante sua participação ativa nas práticas culturais. Nesta perspectiva, o desenvolvimento e a inclusão escolar da criança diagnosticada como deficiente intelectual são temas de interesse para a investigação empírica. Fundamentando-se nesta abordagem, o presente estudo tem como objetivo analisar a natureza e a qualidade da interação social de crianças com deficiência intelectual no contexto escolar, em articulação com os princípios, pressupostos e práticas da educação inclusiva. Focaliza três campos sociais para análise: escola, classe inclusiva e experiência social criança-criança, nas dimensões social, relacional e simbólica. Participam como sujeitos focais três alunos com Síndrome de Down, dois meninos e uma menina com, respectivamente, sete, oito e quatro anos de idade, estudantes do 1 e 3 períodos de uma escola pública inclusiva de educação infantil do Distrito Federal. Participam, ainda, seus colegas de turma e respectivas professoras regentes, além de uma professora especializada de apoio. Os dados foram construídos mediante notas de campo, entrevista com professores e observação dos alunos em atividades curriculares livres e estruturadas, gravadas em vídeo. Nove segmentos de episódios de intercâmbio social, dentre as atividades gravadas, foram selecionados e analisados microgeneticamente, buscando-se identificar processos de comunicação e metacomunicação, orientação para objetivo e co-construção de significado nos processos de interação entre pares. As questões de pesquisa tiveram como foco a (in)existência de padrões comportamentais típicos da criança com deficiência intelectual, neste caso, com Síndrome de Down, bem como a disponibilidade mútua para estabelecer intercâmbio social e relações grupais com os colegas. Buscou-se caracterizar movimentos de proximidade e afastamento entre pares, focalizando as condições mediacionais envolvidas, dentre elas, a fala incipiente da criança com deficiência. Por meio do estudo foi possível verificar elementos culturais, políticos e pedagógicos da escola, reveladores de barreiras para o seu desenvolvimento inclusivo. Quanto à interação criança-criança, pôde-se inferir que as características fenotípicas dos sujeitos focais, bem como o status de deficiente a eles atribuído, não produzem impacto direto na interação com seus pares na escola. As análises revelam a inexistência de padrões interativos típicos, em suas trocas sociais, além de indicar a influência relativa exercida pela sua fala incipiente. Por outro lado, dificuldades relacionais foram verificadas associando-se, principalmente, à persistência de comportamentos isolados, cristalizados e anti-sociais, observados na menina com Síndrome de Down, prejudicando a co-construção e manutenção de frames interativos com seus pares. O mesmo não foi observado na interação dos dois meninos, onde prevaleceram intercâmbios cooperativo, convergente ou ambivalente, afetivamente mediados. Limitada na expressão verbal, a comunicação dos sujeitos focais apoiou-se em estratégias metacomunicativas, como som vocal, mímica, gesto e atitude corporal, utilizados para complementar ou substituir a fala incipiente. Os resultados dão elementos para inferir a necessidade de educação emocional e social para todos os alunos, por meio de processos de canalização cultural e recursos mediacionais apropriados, particularmente protagonizados pelos professores, de modo a favorecer-lhes a aprendizagem, o desenvolvimento e a inclusão escolar.